Scott Turow, advogado criminalista e escritor norte-americano nascido em Chicago em 1949, é um dos maiores autores de best-sellers: 12 livros publicados, 30 milhões de exemplares vendidos e obras traduzidas para 40 idiomas, todas elas criadoras de suspense jurídico.
“Testemunho” (Bertrand Editora, 2017) é um thriller sobre a guerra da Bósnia (1992-1995), escrito mais de vinte anos após o fim do conflito. O colapso da Jugoslávia e a declaração de independência da República da Bósnia e Herzegovina em 1992 desencadearam uma carnificina inter-étnica, na qual sérvios, croatas e muçulmanos bósnios em massacres genocidas assassinaram com uma brutalidade e complexidade tais que horrorizaram e desconcertaram o Mundo.
Pelo menos 100.000 pessoas foram mortas, muitas por “limpeza étnica” sistemática. As consequências e a contabilidade legal dessa guerra continuam até hoje. Radovan Karadzic, o líder sérvio da Bósnia capturado em Belgrado em 2008 e levado perante o Tribunal Penal Internacional para a ex-Jugoslávia em Haia, foi condenado a 40 anos de prisão por genocídio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
É neste contexto que Scott Turow definiu este romance, policial, político e humano, trocando os tribunais americanos dos livros anteriores – como em “Presumido Inocente” ou “O Peso da Prova” – pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) de Haia, na Holanda.
O “Testemunho”, cujo prólogo consiste no interrogatório à “Testemunha nº 1”, única sobrevivente de um massacre perpetrado num campo de refugiados nos arredores de Tuzla contra a etnia rom, tem como personagem principal o advogado Bill Tem Boom, que trabalha como procurador no TPI e no processo, não resolvido, que restou da guerra da Bósnia: o desaparecimento de 400 ciganos, na sequência daquele conflito. Estas são as vítimas menos reconhecidas da guerra – insultadas e incompreendidas por todos lados – que, em 2004, foram levadas e enterradas vivas numa antiga mina de carvão. A pergunta transversal do livro é: Quem os assassinou? Paramilitares sérvios? Jihadis islamistas? A Máfia bósnia? As Forças dos Estados Unidos? Desvendar as complexidades e os atores do conflito requer uma considerável definição da cena sobre a qual se incide, onze anos após os acordos de Dayton.
No centro da trama está Laza Kajevic (criminoso de guerra), o fugitivo líder sérvio-bósnio suspeito de enviar os seus homens para procederem ao extermínio do povo Romani. Apesar do aviso do autor de que “nenhum personagem é uma representação de qualquer um que tenha vivido”, Laza parece ter sido claramente modelado no verdadeiro Karadzic, desde seu elaborado penteado até à sua altiva arrogância/brutalidade alegre.
O massacre bósnio não oferece conclusões morais fáceis e, para seu crédito, Scott Turow não sugere nenhuma. Como as tentativas do TPI de fazer justiça (retrospectiva) à Bósnia, o enredo serve o propósito admirável e importante de fazer a justiça ao povo romani. Um thriller interessante, que não recusa incursões a ligações eróticas e emocionais do protagonista, com uma excelente exposição sobre o direito internacional e que confere visibilidade a um período muito triste e inacreditavelmente cruel da história recente europeia.
Sem Comentários