No Outono do ano 937 d.C., a Batalha de Brunanburh definiu um mapa político que persiste até hoje, no qual se destaca a fundação de uma nação: a Inglaterra. Tal batalha, que os cronistas da época asseguram ter sido a maior chacina ocorrida até então na sua ilha, constitui o clímax de “Senhor da Guerra” (Saída de Emergência, 2022), o 13º volume da saga As Crónicas Saxónicas, de Bernard Cornwell.
O protagonista, Uhtred de Bebbanburg, encontra-se agora envelhecido, confiante de já ter conquistado o direito a um final de vida pacato. A terra dos seus antepassados fora-lhe roubada quando ainda era criança, e ele devotou a maior parte da vida a recuperá-la, guerreando por toda a Bretanha, mas a rivalidade entre as potências que o cercam representa uma nova ameaça.
Alfred, o falecido rei que Uhtred serviu, sonhara unificar os quatro países que compunham a Bretanha saxã. O seu neto Æthelstan reina já sobre três, restando-lhe anexar a Nortúmbria, que jurou não invadir enquanto Uhtred vivesse, pois é lá que se situam os domínios deste homem que o protegeu, o amou como a um filho e o ajudou a subir ao trono. Quando a ganância e a vaidade ultrapassam a gratidão, o rei quebra o juramento, alegando razões espúrias para este não ser vinculativo. Afinal, para a juventude que habita a corte, homens como Uhtred não passam de relíquias irrelevantes do passado, empecilhos ao futuro grandioso que pretendem construir. Porém, os escoceses e os irlandeses opõem-se aos planos de Æthelstan, contrapondo-lhes as suas próprias ambições expansionistas.
Perante a fraqueza do rei da Nortúmbria, incapaz de assegurar a sua independência, Uhtred vê-se enredado numa teia complexa de segredos e traições que o impedem de ver com clareza de onde virá o verdadeiro inimigo. A única certeza é que terá de defender o seu legado da cobiça alheia, recorrendo à astúcia, a uns poucos amigos leais e a uma vasta experiência de veterano de guerra. Entretanto, terá várias surpresas, uma das quais será o reencontro com o filho renegado.
Acresce a tudo isto o facto de a Nortúmbria ser o último reino da ilha dominado por pagãos, num momento em que aumenta a pressão para a cristianização total e o paganismo impenitente de Uhtred é encarado como um desafio aos poderes em ascensão.
Cornwell, nome incontornável do romance histórico, dedica este volume a Alexander Dreymon, o actor que interpreta Uhtred na série televisiva “The Last Kingdom”, tão empolgante quanto os livros na recriação de uma era conturbada. A grande mais-valia da intriga é o seu protagonista inesquecível, capaz de cativar até os leitores menos familiarizados com a saga. Estes podem sentir, por vezes, que lhes falta informação para apreciar plenamente o novo livro, pois existem limites para o que o autor pode resumir sem interromper o fluxo da narrativa. Contudo, isto não é razão para desaconselhar a leitura – o mais recomendável será devorar a saga inteira.
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