“Tudo começou numa pequena e pacata vila rodeada de campos dourados. Há sete meses, as searas de trigo estavam prontas para a ceifa, e quase engoliam uma povoação chamada Sparrow, onde as ovelhas são quatro vezes mais numerosas do que as pessoas, e onde chove duas vezes por ano devido a um feitiço lançado há séculos por um deus zangado – e agora morto. Esta idílica vila do Distrito Ocidental é o local onde Dacre, um deus Subterrâneo que havia sido derrotado, foi a sepultar. E ali ficou durante 234 anos, até que um dia, por altura das colheitas, acordou inesperadamente e se ergueu, irrompendo através do dolo, a arder de fúria.”
Bem-vindos a “Rivais Divinos” (Secret Society, 2024), o primeiro livro de um díptico assinado por Rebecca Ross, autora de romances de fantasia para jovens e adultos. Uma história de amor improvável, que decorre num cenário de guerra entre deuses: Dacre, que viu o seu amor possessivo ser fintado por Enva, que o enganou pondo-o a dormir, num sono que julgava ser eterno; e Enva, que leva os rapazes à perdição – e ao alistamento – com o seu canto de sereia, razão para que a cidade de Oath tenha banido todos os instrumentos de corda.
É em Oath que vai nascer uma outra rivalidade, construída num jornal de nome Oath Gazette, onde Iris e Kitt disputam o lugar efectivo de colunista. Enquanto Iris vive uma vida turbulenta, tentando esticar o parco ordenado até ao final de cada mês, Kitt vive uma vida mais desafogada, ainda que tenha o pai a controlar-lhe o destina, seja profissional ou amorosamente.
A faísca começa a desenhar-se, ao estilo de Nárnia, com a troca de cartas num roupeiro, que fará com que Iris comece a desenvolver um fraquinho pelo desconhecido Forest, com quem vai construindo uma relação com embalo platónico, ao mesmo tempo que começa a olhar Kitt com outros olhos, desenhando um falso triângulo amoroso.
Mais à frente, Rebecca Ross começa a apresentar o conflito entre Celestiais e Subterrâneos, que por vezes parece limitar-se a notas de rodapé como esta: “Os Celestiais governavam o reino superior, e os Subterrâneos o reino inferior. Odiavam-se mutuamente – como os imortais são propensos a fazer – e muitas vezes participavam em desafios, para provar quem era mais digno de ser temido, amado ou nenerado entre os mortais”.
Quando o jornal rival começa a publicar notícias sobre a linha da frente, Iris decide que é tempo de deixar a secretária e tornar-se correspondente de guerra, o que lhe permitirá também descobrir o que é feito do seu irmão, do qual não conhece notícias há vários meses depois de se ter alistado.
Rebecca Ross mostra aos mais novos os horrores da guerra – como as trincheiras e os bombardeamentos -, mas por vezes há demasiados e dispersos focos de atenção difíceis de ligar, entre máquinas de escrever mágicas, um conflito entre deuses que dura há uma eternidade e uma relação amorosa entre pessoas de classes distintas. Veremos como tudo ficou colado em “Promessas Cruéis”, o livro que fecha este díptico para jovens adultos (mesmo jovens).
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