A Antígona, a mais refractária das editoras nacionais, apresentou as suas novidades para a rentrée, que incluem um livro de Angela Davies sobre o conceito e a prática do encarceramento, um novo volume do diário de Witold Gombrowicz ou Dany Laferrière em dose dupla.
As Prisões Estão Obsoletas?
Angela Davis
Tradução e prefácio de Sadiq S. Habib
(Já nas livrarias)
Depois da publicação de “A Liberdade é uma Luta Constante”, damos à estampa “As Prisões Estão Obsoletas?” (2003). Nesta obra, Angela Davis, académica e activista, ícone dos movimentos negro e feminista, debruça-se sobre o conceito e a prática do encarceramento, apontando-o como herança do sistema esclavagista nos EUA (nação com a maior população carcerária do mundo), propondo a transformação radical da forma como a sociedade contempla a punição, o desmantelamento de estruturas que condenam minorias ao encarceramento e a procura de formas alternativas aos actuais sistemas prisionais.
Memória do Fogo I
Os Nascimentos
Eduardo Galeano
Tradução de António Marques
(Já nas livrarias)
“Memória do Fogo (1982-1986)” é a obra de maior fôlego de Eduardo Galeano, fruto de anos de investigação e escrita. Trilogia monumental que desafia as categorias de história e ficção – incompatíveis com a necessidade de expressar a vitalidade do mundo, segundo o autor –, é «a tentativa de resgatar a história viva das Américas em todas as suas dimensões, aromas, cores e dores», traçando a vida de um continente desde os tempos pré-colombianos até aos anos 80, e formando, para muitos, o mais belo historial deste território. O primeiro volume, que se estende das mitologias indígenas sobre a formação do continente ao início do século XVIII, e no qual se sucede um caleidoscópio de conquistados e conquistadores, encerra também um enredo mais vasto: o choque violento entre o Velho e o Novo Mundo.
Cidadã
Claudia Rankine
Tradução de Raquel Madureira e Margarida Vale de Gato
Prefácio de Diana V. Almeida
(10 de Outubro)
“Cidadã” (2014) é um livro sobre actos de racismo quotidiano, na incisiva prosa poética de Claudia Rankine, autora inédita em Portugal. História colectiva da experiência contemporânea da negritude, reflexão sobre a paradoxal invisibilidade e hipervisibilidade do corpo negro, é também uma elegia a afro-americanos assassinados ou tragicamente abandonados pelos poderes públicos, de Trayvon Martin às vítimas do furacão Katrina. Audacioso também na forma, conjugando texto e imagens (de artistas como Carrie Mae Weems, Nick Cave ou Glenn Ligon), é um livro urgente em tempos de debate sobre raça e igualdade.
Los Angeles Times Book Award 2014 | Forward Prize 2015 | National Book Critics Circle Award 2015 | PEN Open Book Award 2015 | finalista National Book Award 2014
Diário
Volume II
Witold Gombrowicz
Tradução do polaco de Teresa Fernandes Swiatkiewicz
(24 de Outubro)
Buenos Aires, 1953. Witold Gombrowicz escrevia as primeiras linhas – talvez das mais memoráveis em toda a literatura – deste diário inclassificável, que só a sua morte interromperia em 1969. Estas crónicas estralejantes sobre uma miríade de temas, em que «cada palavra é escrita contra a corrente» e pura dinamite que rebenta com estrondo ideias feitas, converter-se-iam na magnum opus do autor. Nelas nada sai ileso: o efémero conforto das ideologias, a pequenez dos nacionalismos, o provincianismo literário, a arte politicamente comprometida e a humanidade em geral. No segundo e derradeiro volume do Diário, destaca-se o regresso do autor à Europa – Alemanha e França – depois de vinte e quatro anos na Argentina.
100 Boas Razões para me Suicidar Aqui e Agora + 12 Maneiras de Escapar ao Natal
Roland Topor
Tradução de João Berhan
(7 de Novembro)
Um dois-em-um de Roland Topor sobre questões prementíssimas e anualmente renovadas. Correndo o risco de no-los encafuarem nas prateleiras de auto-ajuda das livrarias deste país, apresentamos mesmo assim dois breves textos, tão úteis como pertinentes numa sociedade onde fazer gazeta à consoada é crime de lesa-majestade e as boas razões para falecer nem sempre nos ocorrem em momentos de aperto. Assim, ficai cientes de que tomar a decisão de ir desta para melhor constitui um acto absolutamente louvável, seja para «não aumentar o défice da segurança social», seja porque Marx (o Groucho, não o outro) lá nos espera, seja porque andamos todos cansados de previsões meteorológicas falhadas. Se o problema é mais o Natal, é coisa que se resolve num ápice: basta «perder a memória com uma paulada na cabeça» ou «tornar-se budista ou muçulmano».
O Grito dos Pássaros Loucos
Dany Laferrière
Tradução de Luís Leitão
(21 de Novembro)
“O Grito dos Pássaros Loucos” (2000) narra o dia em que o mundo do autor desabou e a sua vida mudou para sempre: as últimas horas de Ossos Velhos – alter ego de Dany Laferrière – no Haiti, antes de escapar da ditadura de Duvalier e depois do assassínio do amigo e jornalista Gasner Raymond pelos Tontons Macoutes. Um último dia nas ruas de Port-au-Prince, e uma só pergunta: o exílio ou a morte? É o drama da despedida, da pressa de ver pela última vez os locais da infância, das palavras que ficarão por dizer, e a história de um protagonista que, como Antígona – a metáfora do destino da personagem –, se deve revoltar contra um ditador-Creonte, ainda que o futuro lhe reserve apenas o muro da separação e da solidão. Um romance sobre a condição do exilado e o desenraizamento de homens vítimas de homens.
Como Fazer Amor com Um Negro sem se Cansar
Dany Laferrière
Tradução de Luís Leitão
(21 de Novembro)
Montreal, um Verão escaldante nos anos 80. Um quarto exíguo habitado por dois pelintras negros: Cota – aspirante a escritor à la Bukowski e Miller, que, armado com uma impertinente Remington 22, quer mandar James Baldwin arrumar as botas – e Bouba, fanático por Coltrane e Parker, eremita que vive refastelado num divã, a ler Freud e o Alcorão. Os dois levam uma alegre vida boémia de sexo e jazz e, em nome da desforra pela colonização, travam a luta racial na horizontal, assombrados pelo portento sexual do prédio – o Belzebu do Andar de Cima –, que ameaça desmoronar-lhes o tecto. Brilhante e provocador, traduzido em várias línguas, a estreia (1985) de Laferrière é uma sátira feroz aos estereótipos racistas, que explodiu como uma bomba no mundo francófono, consagrando um autor que continua a destilar humor e ritmo. Adaptado ao cinema por Jacques Benoît em 1989.
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