Se é uma daquelas pessoas que desconversa sempre que alguém fala da música que quer ouvir no seu próprio funeral, “Questões de Vida e de Morte” (Kalandraka, 2024) pode bem ser o impulso para começar a lidar com a paragem final do autocarro terreno. Assinado por Iona Heath, o livro coloca e tenta responder a algumas perguntas tão essenciais quanto estas: que formas de morrer desejamos para nós e para aqueles de que gostamos? Como lida a medicina com a morte? Como tornar a morte mais digna e mais humana?
Depois de assinalar “a dívida maior para com John Berger” – que tem aqui uma pequena contribuição -, com quem trocou cartas ao longo de vários anos, Iona Heath começa por deixar uma das ideias centrais do livro, a partir da qual viajaremos: “Morrer permeia a vida, mas grande parte da resposta pública à morte e ao morrer oscila entre o sensacionalismo e o silêncio”.

Tendo um percurso firmado como médica de familia, a autora diz ter a consciência do seu falhanço sobre “muitos” dos seus pacientes – “especialmente àqueles que estão às portas da morte” -, o que faz com que deixe duas das questões fundamentais que estão no cerne deste pequeno livro: “O que é, aliás, uma boa morte? Que maneira de morrer queremos para nós próprios e para aqueles que amamos?”. Relativamente aos médicos de família, a autora destaca – talvez seja mais acertado dizer “lamenta” – o facto de estes terem ficado afastados do papel tradicional de serem o “último na morte” dos seus pacientes.
Ao longo de cerca de 170 páginas, Iona Heart reflecte sobre um tema fundamental – e inescapável – da existência, um tema que a contemporaneidade insiste em negar, vendendo-nos uma ideia de imortalidade que pode comprada em várias áreas. Pelo caminho, escreve que “o suicídio continua a ser um direito humano”, recupera W.G. Sebald para falar da “permeabilidade das barreiras entre os mortos e os vivos, e entre o tempo e a eternidade”, abraça “o inextinguível sentimento de esperança”, critica as políticas da medicina em geral ou, imagine-se, aponta escritores e poetas como uma ajuda preciosa para que os médicos mantenham o foco e a sanidade. Um enorme ensaio com selo da Kalandraka – na chancela Faktoria -, que integra a recomendada colecção Ágora K.
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