Cara Hunter vive em Oxford, numa rua que, segundo a própria, não será muito diferente daquelas que servem de cenário aos seus livros – apesar de ter feito alguns desvios à geografia real e inventado alguns lugares pelo caminho.
Nesta série de thrillers o foco está apontado ao inspector-chefe Adam Fawley, um tipo com dificuldade em lidar com homens a chorar e que carrega consigo um passado traumático, o que faz com que, no silêncio da observação dos cenários de crime, dê por si a partilhar com o leitor tiradas como esta: “Nunca percebi porque é que as pessoas compram alcatifas claras, sobretudo quando têm crianças, mas não me parece o momento certo para discutir essa questão”.
“Perto de Casa” (Porto Editora, 2018), o primeiro livro da série, gira à volta de um tema policial clássico: o rapto de uma criança. Algo que, na maior parte das vezes – nove em dez, segundo Fawley -, está ligado a alguém que a vítima conhece bem: “Um familiar, um amigo, um vizinho, alguém da comunidade”.
Enquanto a notícia se vai construindo no twitter, Adam tira a radiografia ao quarto onde vivia Daisy Mason, de oito anos, desaparecida durante uma festa: “Há quartos vazios que espelham as pessoas que outrora os habitaram. Mas este representa o vazio da ausência, não da presença”. Um quarto que, em homenagem ao nome floral da jovem, está impregnado de simbologia: “Isto não é um quarto, é um parque temático”.
O pai de Daisy, Barry, é construtor, e parece ter uma agenda escondida; a mãe, Sharon, é obcecada por questões de imagem, e parece não ter ficado com uma grande mossa pelo desaparecimento da filha; quanto ao irmão, Leo, está claramente a esconder o jogo, e sabe de algo que poderá ser crucial para a investigação. Uma corrida contra o relógio que Cara Hunter alimenta com habilidade, num clima de tensão que reserva ainda um pequeno incêndio para as últimas páginas.
“Pura Raiva” (Porto Editora, 2021), o quarto título da série, está uns bons furos acima de “Perto de Casa”, numa história onde Adam Fawley parece estar a reabrir a porta da parentalidade: “Este não será um substituto, mas talvez ele – ou ela – ainda consiga vir a representar uma redenção”.
Nos arredores de Oxford, Faith, uma adolescente, é encontrada a vaguear pelos arredores da cidade, com arranhões nos nós dos dedos, marcas vermelhas nos pulsos, um rabo de cavalo quase desfeito e o rímel esborratado. Isto depois de lhe amarrem um saco de plástico na cabeça e a terem levado para um local isolado, fazendo da sua sobrevivência um milagre. Apesar de tudo isto Faith recusa-se a fazer queixa, algo que deixa inquieto o inspector-chefe Adam Fawley.
Quando uma segunda rapariga desaparece, o estado de inquietação de Fawley atinge o ponto máximo, transportando-o a um caso que teve entre mãos no passado e que, agora, pode levar a que um tipo perigoso saia da prisão mais cedo.
Cara Hunter assenta a trama em dois universos paralelos: o dos adolescentes e da sua busca pela identidade e pela afirmação; e o de Adam Fawley, que aqui acompanhamos através de entradas de diário meticulosamente datadas, num limbo existencial que promete estar para durar. O ritmo está no ponto e, mesmo que parte da trama possa não corresponder ao faro policial do leitor, o final deixa no ar de que o próximo livro será imperdível. Além destes títulos, estão disponíveis nas livrarias dois outros livros da série Adam Fawley: “No Escuro” e “Sem Saída”.
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