Nascido em 1991, Andrew Ridker é o editor de Privacy Policy: Anthology of Surveillance Poetics, escrevendo para publicações como The New York Times, Le Monde, Bookform, The Paris Review Daily, Guernica ou Boston Review, entre outras. A sua estreia literária deu-se em 2019 com “Os Altruístas” (Quetzal, 2021), um romance sobre a disfuncionalidade que assiste a uma família, feito de humor, infidelidade e redenção.
Arthur Miller, “um judeu por temperamento e não por prática”, está metido num sarilho de todo o tamanho. Para além de não passar de um mediano professor universitário de Engenharia no Midwest, está sem dinheiro para pagar a hipoteca, tem uma relação bastante marada com a namorada (uma medievalista três décadas mais nova) e dois filhos que não lhe ligam nenhuma, isto desde que souberam que o pai andava metido numa embrulhada infiel enquanto a mãe, uma psiquiatra especializada em terapia familiar e de casal, lutava pela sobrevivência – uma luta entretanto perdida. Após o funeral de Francine, que lhes deixou uma pequena e desconhecida fortuna, os filhos mudam-se ambos para Nova Iorque, deixando o pai entregue a si próprio.
Ethan é um jovem bastante sensível, às voltas com a sua sexualidade, um recluso convicto que trabalha a partir de casa e evita sempre que pode os contactos sociais – em suma, recusa ser uma pessoa pública. Para ele, “a casa de família e a humilhação eram inseparáveis”, e desde cedo percebeu o que queria da vida: “nenhum cinismo, nenhuma pretensão, somente a honestidade desbotada da existência”; quanto a Maggie, escolheu a postura de boa samaritana, recusando a ideia de capitalismo e procurando, incessantemente e não sem alguma ingenuidade, o “alívio do fardo de sermos nós próprios”, parecendo estar sempre num estado de sub-alimentação.
Numa muito interesseira tentativa de reconciliação, Arthur convida os filhos para passar os dias de Páscoa na casa de família, e é então que o passado se vê revisitado, mastigado, triturado e atirado como arma de arremesso, podendo a salvação residir estranhamente em quem ficou já para trás.
Andrew Rilke mostra-nos, como tão bem Douglas Coupland o escreveu num título dos seus livros, que todas as famílias são psicóticas, movendo-se nas sombras, carregando segredos, guardando ressentimentos, deixando atrofiar o músculo da empatia, mas também conseguindo encontrar forças para praticar o bem. Mesmo que, como Maggie o diz nas primeiras linhas, tal não seja tarefa fácil: “Porque esse era o problema de se tentar fazer o bem: acabávamos sempre por levar um soco na barriga”. O trabalho de Rilke é fenomenal na forma como avança e recua na linha temporal, mostrando todas as subtilezas, desilusões, sonhos e esperanças que as personagens vão deixando pelo caminho, mas também a forma em como superam o seu próprio falhanço e atrofio. Muito prometedora, esta estreia.
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