Primeiro, houve uma avozinha com dotes para o gagsterianismo que, certamente, teria caído nas boas graças de Don Corleone; depois, uma dentista com um plano verdadeiramente malévolo, que oferecia doces às crianças – e uma pasta de dentes manhosa – para que os seus dentes se estragassem mais depressa; e, por último, uma tia chamada Alberta, com poucos dotes relacionais e que tinha, como melhor amiga, uma coruja com quem se deitava e ia planeando tirar a herança à sobrinha orfã.
São assim os livros de David Walliams, que trata o politicamente incorrecto por tu e que oferece às crianças histórias com enredos pouco vulgares na literatura infanto-juvenil. “O rapaz milionário” (Porto Editora, 2016) será, por isso e um pouco estranhamente, o livro de Walliams menos arrojado ou, talvez, aquele que ofereça uma moral mais consentânea com o espírito da normalidade: o dinheiro (só por si) não traz a felicidade.
Joe é um rapaz muito rico. Tão rico que, com apenas 12 anos, é o miúdo com mais dinheiro de todo o país. Entre os seus muitos pertences estão uma pista de fórmula 1, um cinema ou um orangotango-mordomo. E muitos, mesmo muitos milhões na conta. A fortuna de Joe e do Sr. batata, o seu pai, deve-se ao facto de este último ter inventado, depois de uma vida inteira a enrolar, um rolo de papel higiénico que era seco de um lado e húmido do outro. Uma invenção de dupla face que ficou conhecida como RabinhoFresco, e que fez do Sr. Batata um homem muito rico: de cada vez que um rolo era vendido recebia 10 cêntimos, e se dissermos que todos os dias eram vendidos milhões de rolos é só fazer as contas.
Porém, por muito dinheiro que o Sr. Batata levasse para casa, faltava a Joe uma coisa que dificilmente o dinheiro poderia comprar: um amigo verdadeiro. Cansado de ser chamado de Rapaz Rabiosque ou o Miúdo do Papel Higiénico nos colégios caros que ia frequentando, Joe pede ao pai que o deixe frequentar uma escola pública, onde tentará ser apenas um miúdo normal entre miúdos normais. A coisa até parecia estar a correr bem, quando conhece um rapaz cheinho como ele chamado Bob, mas a partir do momento em que o pai chega ao recreio de helicóptero e um aparato de todo o tamanho, tudo se complica novamente. Porém, no meio de muitos interesses, uma péssima cozinheira, um par de gémeos arruaceiros, subornos, esquemas, amores fabricados e zangas, há espaço para Joe descobrir a verdadeira amizade – e, claro, aquilo que verdadeiramente é importante na vida.
Apesar de ser o livro menos irreverente de Walliams, “O rapaz milionário” é ainda assim um festim de gargalhadas e boa disposição – ajudado pelas sempre fantásticas ilustrações de Tony Ross -, que confirma Walliams como um autor para ser mantido debaixo de olho pelos mais novos. A boa notícia para estes é que, de momento, está garantida a publicação de pelo menos mais dois títulos do autor pela Porto Editora até ao final do ano: “Oh, não! Adotei um elefante!” (ainda este mês), mais virado para o público infantil, e “Rato Picado” (Junho), onde um vendedor de hambúrgueres cego pretende inovar na receita.
3 Commentários
Adoro
Adoro
adoro