Eddie Jaku, sobrevivente do Holocausto, celebrou o seu 100º aniversário com a publicação das suas memórias em livro. Escrito 75 anos após a libertação de Auschwitz, “O Homem Mais Feliz do Mundo” (Objectiva, 2021), é um testemunho inspirador de resistência individual e colectiva no centro da “sociedade mais cruel da história da humanidade”.
Nascido e criado em Leipzig, em 1920, no seio de uma família judaica, Abraham Solomon Jakubowicz (ou Eddie, como gosta de se tratado) tinha 13 anos quando Adolf Hitler ascendeu ao poder na promessa de reconstruir a economia de uma Alemanha empobrecida pela Primeira Guerra Mundial. Originando uma onda de anti-semitismo, o Führer implementou leis raciais e provocou a Kristallnacht, durante a qual os nazis incendiaram sinagogas, saquearam lojas e espancaram judeus. Infelizmente para Eddie Jaku e tantos outros, este seria apenas o “início do pesadelo”. Privado da liberdade religiosa e da chance de obter uma educação formal, o jovem Eddie viu-se forçado a assumir uma identidade falsa para escapar à perseguição do Terceiro Reich. No entanto, acabou sendo capturado e enviado para Auschwitz, onde o condenaram a uma morte lenta — assim perderia a “dignidade, a liberdade e a fé na humanidade”.
Dos cerca de 1,3 milhões de pessoas escravizadas em Auschwitz, estima-se que mais de um milhão de europeus, a grande maioria judeus, tenham morrido naquele campo de extermínio. Faminto, esgotado e gelado, Eddie conseguiu “alimentar a esperança” de continuar a viver, mas foi a amizade, a entreajuda e a benevolência que o mantiveram vivo — esse foi “o maior milagre de todos”, afirma. Ao contrário dos seus familiares, Eddie conseguiu escapar às execuções arbitrárias, resistiu à matança desenfreada e sobreviveu à Marcha da Morte que antecedeu a libertação dos campos de concentração em Janeiro de 1945.
“O Homem Mais Feliz do Mundo” traz-nos uma descrição inteligível e pungente da violência obstinada do regime nazi. Embora o retrato desolador dos horrores do Holocausto e reflexões acerca da condição humana não sejam tão aprofundados como os de Primo Levi ou Viktor Frankl, o sóbrio depoimento de Eddie Jaku destaca-se pela energia catártica com que o autor, ao partilhar as suas memórias, exorciza a ira e suprime a tristeza que Auschwitz lhe deixou.
Mas, no fundo, será que Eddie não odeia os seus captores? Não detesta os carrascos dos seus pais e amigos? Não abomina Hitler? “Não, não odeio ninguém”, declara. A única vingança que admite é mostrar ao mundo que, apesar das terríveis circunstâncias, um sobrevivente do Holocausto pode “ser o homem mais feliz à face da Terra”.
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