Desenganem-se aqueles que esperam encontrar, em “O Fado Ilustrado” (Arte de Autor/A Seita, 2022), uma história das vozes que melhor cantaram – ou ainda cantam – a tristeza e a saudade. Escrito e desenhado por Jorge Miguel, este álbum de banda desenhada parte do quadro “O Fado”, de José Malhoa, para mergulhar na história de um Portugal na transição da Monarquia para a República.
Lisboa, 1904, e uma bomba construída para um anarca de cartola. Começa aqui esta viagem histórica, que recua de pronto a 1898 e à Praça do Duque da Terceira, Lisboa, onde Eça e Ramalho trocam opiniões sobre o que o Rei D. Carlos poderia fazer a mais. Rei que, por esta altura, trata de ir descansando na sua Herdade do Vidigal, entretendo-se a pintar aguarelas.
Jorge Miguel abre-nos a porta do Gelo, o café dos anarquistas, onde Eça se arma aos cucos recebendo o seguinte troco: “Ó Mirita, tu que falas mirandês, vê lá se percebes o que querem estes estrangeiros”.
Quanto a José Malhoa, pretende pintar uma fadista de rua, que viu “acompanhada por um guitarrista macambúzio”. Crê que a mulher se chama Adelaide, mais conhecida como “a órfã do fado”, mas a tarefa não será fácil. Segundo o “Amâncio da navalha”, tipo que vai sobrevivendo à custa de assaltos à mão armada e outros crimes menores, o companheiro de Adelaide “até o parto cobrou à própria mãe”, e Malhoa tem tudo para acabar mal.
“O Fado Ilustrado” é uma viagem pela História, que atravessa o mapa cor-de-rosa, os “vencidos da vida”, a carbonária ou a 1ª Guerra Mundial e a Batalha de Flandres, para a qual o Corpo Expedicionário português parte em 1916. Tudo com muito humor e espírito caricatural, à boleia de personagens como Eça de Queiróz, Ramalho de Ortigão ou do próprio Rei D. Carlos, aqui vivendo o seu canto de cisne.
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