“O Escritor e o Prisioneiro” (Edição independente, 2018), terceira obra da escritora Rute Simões Ribeiro, é tão surpreendente quanto as duas anteriores, exprimindo um misto de emoções e sentimentos sobre as perplexidades da vida.
Trata-se de uma longa conversa entre um prisioneiro e o seu médico psiquiatra, que se inicia quando Tom, o prisioneiro, diz que “Era preciso saber se não estou louco”, frase que tem ínsita o passado e o presente e a partir da qual tudo se desenrola.
Num quase monólogo, intercalado apenas com perguntas abertas e pontuais, próprios dos profissionais da saúde mental, Tom narra a sua relação com outro prisioneiro, Otto, um escritor condenado por ter cometido um crime de plágio (“quem me acusa defende que um livro que terei escrito é a cópia da sua vida, que lhe copiei os traços, as expressões, os comportamentos, as escolhas, mas que o terei dissimulado ao não ter narrado acontecimentos”), crime que muito surpreende Tom: “Crime. Ora aqui está uma novidade. O crime de copiar um homem. A arma a literatura”.
Otto, o escritor, quer mostrar a Tom as cartas que recebeu do homem copiado, que as escrevera quando Otto estava já na prisão, provocando em Tom uma intensa perturbação. A compreensão dessa perturbação e obsessão é essencial para que o leitor compreenda a confusão identitária entre o escritor e a sua própria obra, tema central desta incursão de pensamentos estruturais de uma autora inquieta, transpostos para o diálogo entre o paciente e o psiquiatra – que mais não são do que o espelho dos diálogos entre o autor e a sua própria obra: “De quem é um livro se não do seu próprio tema. O escritor é autor, o assunto proprietário. O assunto o homem”.
Os diálogos são cirurgicamente precisos e vão ao encontro das grandes questões do Homem sobre a Vida, questões permanentes colocadas mas poucas vezes obtendo o esclarecimento devido. A dúvida, nesta obra, é metódica, no sentido cartesiano, uma dúvida posta ao serviço da verdade, colocando tudo em causa neste incessante processo de busca dos princípios fundamentais da existência humana. Um pequeno grande livro, que contém uma busca – sem fuga – pela verdade.
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