É sabido que, tal como noutras áreas da vida, a Literatura é feita, muitas vezes, de fórmulas. Com “A verdade sobre o caso Harry Quebert”, Joël Dicker encontrava a sua própria fórmula, num livro bem desenhado que mostrava, para além de uma trama arrojada, uma escrita que juntava a intriga policial a um espírito literário light mas refrescante. Seguiu-se “O Livro dos Baltimore”, que regressou ao universo do livro anterior para fechar de vez o capítulo, onde apesar de a trama perder algum fulgor e as viagens temporais serem a certa altura confusas, as personagens ganhavam um outro tipo de profundidade.
Para quem leu os dois livros anteriores, “O Desaparecimento de Stephanie Mailer” (Alfaguara, 2018) irá parecer-se, em parte, com a estrutura montada “A verdade sobre o caso Harry Quebert”, a que não faltam as viagens de ida e volta no calendário e uma narrativa em crescendo até à revelação final. O que até nem seria mau, não fosse o novo livro ser tão aborrecido que chega a doer: a trama está desenhada a lápis, as personagens não têm profundidade, os conflitos não existem ou são ténues e, quanto ao desenlace, está a milhas de provocar qualquer sobressalto. Para não falar de algumas partes verdadeiramente pavorosas de escrita – sobretudo as relacionadas com sexo -, que levam a pensar que alguém terá editado o livro enquanto Dicker tirava uma pausa para ir ao quarto de banho ou fumar um cigarro. O método, esse, é o mesmo: capítulos curtos, deixados em lume brando pela interposição de um outro, tentando com isso despertar a voracidade do leitor no virar das páginas.
O início é prometedor, com a entrada em cena de Jesse Rosenberg, conhecido como o Capitão 100% por ter resolvido todos os casos que lhe vieram parar às mãos durante duas décadas. No dia em que anuncia a reforma, Rosenberg vê-se confrontado por Stephanie Mailer, uma jornalista que lhe diz que, em boa verdade, deveria assinar antes como Capitão 99%, já que, vinte anos atrás, havia prendido o homem errado num assassínio brutal que envolveu várias mortes, incluindo a do Presidente da Câmara de Orphea e toda a sua família. E que, sem lhe revelar grandes pistas a Rosenberg, lhe deixa uma frase que lhe dá que pensar: “A solução estava mesmo debaixo dos seus olhos, acontece que não a viu“.
Rosenberg põe assim a reforma em pausa para desespero do seu chefe, resgatando Derek Scott, o seu parceiro de há duas décadas, de uma vida banal, para regressar à investigação que quase lhe tinha dado cabo da moleirinha. A eles junta-se Anna Kanner, recentemente divorciada, chefe-adjunta da Polícia de Orphea e que, segundo uma amiga, parece quase uma avó. Quando Stephanie desaparece e as primeiras mortes surgem, abre-se um portal que liga ambas as investigações, que parece indicar que o verdadeiro assassino está ainda por caçar. Stephanie que, aparentemente, andaria a escrever um livro por encomenda sobre o massacre de há vinte anos.
A chave para o mistério está relacionada com “A Noite Escura, que parece estar impressa em todo o lado, desde folhas deixadas misteriosamente em gavetas, graffitis feitos nas paredes pela calada ou mesmo em peças de teatro de qualidade duvidosa. Não faltam questões e suspeitos a juntarem-se à fila mas, para o leitor, a longa viagem que terá de percorrer não irá oferecer uma chegada à meta com confettis, acenar de bandeira ou a entrega de uma medalha num pódio caprichado. Uns bons furos abaixo em relação aos livros anteriores.
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