“My name is Bond. James Bond“. Muitos conhecerão esta frase, uma das mais emblemáticas que foram já proferidas num ecrã de cinema, mas poucos saberão onde foi Ian Fleming buscar inspiração para trazer, para dentro da literatura, o mais famoso agente secreto da história, apreciador de um bom Martini, playboy inveterado e possuidor de um sentido de humor inglês (e mais além).
“Na Toca do Lobo” (Vogais, 2017), de Larry Loftis, conta-nos a vida de Dusko Popov, um agente duplo britânico que se veio a transformar num dos mais bem-sucedidos espiões de sempre, e isto ao serviço de três poderosos mestres de guerra: Abwehr, MI5 e MI6 e FBI.
Para Loftis, Popov foi um “vilão e herói, assassino e amante, impostor e patriota“, utilizador de mil máscaras que utilizava criteriosamente mas sempre com o intuito de estar no centro das atenções, sem medo do brilho ou do calor dos holofotes.
A biografia de Loftis começa em 1912, em Titel, cidade sérvia, lugar de nascimento de Dusko Popov. Popov estudou mais tarde na Alemanha, tendo entregue em 1937 a sua tese intitulada “Vidovdan e a Constituição de Setembro da Jugoslávia”. Antes de partir para uma merecida comemoração em Paris fez um discurso a favor da democracia, tendo a partir de então a Gestapo à perna – que o deteve pouco tempo depois, colocado na prisão sob a acusação de “namorar com uma rapariga que trabalhava numa fábrica“. “De forma misteriosa, foi subitamente libertado e recebeu indicação para sair do país em 24 horas“, tendo apanhado um comboio para a Suiça.
A 4 de Fevereiro de 1940, na altura em que exercia Direito em Dubrovnik, recebeu um telegrama que veio a mudar a sua vida: “Preciso de me encontrar consigo urgentemente. Proponho 8 Fevereiro, Hotel Serbian King, Belgrado“. A missiva vinha assinado por Johnny Jebsen, um conhecido de Popov, que pouco tempo depois se tornava um agente duplo ao serviço da Abwehr e do MI6.
Loftis dedica boa parte do livro aos tempos em que Dusko Popov viveu em Lisboa. Graham Greene, chefe da delegação portuguesa do MI6 em 1943, disse de Popov: “Era um jogador dostoievskiano-cavalheiresco e superior às paixões do jogo“. Foi em Lisboa que Ian Fleming assistiu, no Casino Estoril, a uma aposta de Popov, que acabou por ser a grande inspiração de “Casino Royale” e a base dos vários 007.
A biografia estende-se ao final da carreira de Popov, ao momento em que, incapaz de premir o gatilho – algo substituído por um espancamento quase até à morte -, vomita os pecados, a vergonha e a dor, sobrevivendo à toca do lobo e deixando para trás os comprimidos, a benzedrina, o soro da verdade, as bombas no carro e uma vida ao serviço da espionagem. Ele que acabou condecorado em 1947 com a Ordem do Império Britânico e que, sobre 007, disse qualquer coisa como isto: “Se Bond fosse de carne e osso, teria sido morto em 48 horas“. Uma vez mais, a realidade a dar uma valente coça à ficção.
“Na Toca do Lobo” é uma biografia plena de detalhes, narrada quase como um livro de espionagem, que apresenta apêndices, mapas, contas de hotel, cartas e memórias esquecidas, tudo para nos mostrar a vida e várias máscaras usadas por Dusko Popov, um 007 de carne e osso.
Larry Loftis licenciou-se em Ciências Políticas e obteve o mestrado em Direito na Universidade da Florida. Foi professor adjunto e editor executivo da revista de Direito da mesma faculdade. É autor de dois livros de não-ficção.
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