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Livros a Oeste 2022: Quem mostra’ bo ess caminho longe?

Por Pedro Miguel Silva · Em 13/05/2022

Lusofonia, identidade, (des)acordos ortográficos e uma evocação a Bernardo Sassetti, 10 anos e um dia após a sua morte. Temas que estiveram em foco no Livros a Oeste na noite de 11 de Maio, numa conversa intitulada “Temos Fantasmas Tão Educados, Que Adormecemos No Seu Ombro”. Conversa que juntou, no Auditório Dr. Afonso Rodrigues Pereira da Lourinhã, João Melo, Sérgio Godinho e Tony Tcheka.

Foi com a memória – e um tira-teimas linguístico – de “Queixa das Almas Jovens Censuradas”, canção de José Mário Branco a partir do poema escrito pela poetisa Natália Correia, que João Morales convidou cada um dos autores a apresentar o seu livro mais recente livro com edição nacional.

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Após uma longa viagem pela poesia e pelo conto, e depois de ter arrumado com a vida política e o mundo da publicidade, o escritor angolano João Melo decidiu estrear-se no romance com “Será Este Livro Um Romance?” (Editorial Caminho, 2022). “A culpa foi da pressão do editor”, brincou, para logo depois revelar que “na verdade também gostaria de experimentar o género”. Curiosamente, a primeira tentativa de romance deu-se em 2016, quando começou a escrever sobre os primeiros 40 anos da independência de Angola – livro que ficou interrompido e se viu ultrapassado pela urgência deste, surgido em tempos de pandemia e escrito num período de três meses. Um livro onde procurou, não sem antes afirmar que não é ele o protagonista escritor de forma a prevenir cancelamentos futuros, “ajustar várias contas, com várias coisas, com várias teses e experiências”, fazendo uso da linhagem da literatura angolana que usa o humor e a ironia como forma de expressão. “Os naturais de Luanda temos pela mania. Somos muito engraçados”.

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Durante a tarde, numa conversa com alunos da Escola Secundária da Lourinhã, João Melo disse ter crescido num ambiente familiar privilegiado, com acesso a livros, tendo o apelo da escrita surgido após o regresso de uma viagem de comboio quando tinha quinze anos. “Foi uma coisa estranha, difícil de explicar”. Um apelo a que esteve associado o enorme Fernando Pessoa: “Li um poema de Pessoa que este escreveu quando tinha cinco anos, e pensei que tendo quinze também o poderia fazer”. O poema, lido por João Morales, tem o título de “À minha querida mamã” e reza assim:

Ó terras de Portugal
Ó terras onde eu nasci
Por muito que goste delas
Inda gosto mais de ti.

No seu percurso literário, o escritor angolano disse ter seguido os conselhos de dois ilustres companheiros de letras: de Luandino Vieira, o mandamento de ler muito e de não ter medo de rasgar; de Manuel Rui, a ideia de que a poesia não deve dizer muito, antes insinuar. Fazendo a ligação da poesia à música, falou dela como fazendo parte da “natureza mais radical e profunda do ser humano”. Depois de destacar o carácter mutável da língua portuguesa, relacionado com os vários países e geografias onde é falada, deixou um conselho em forma de verso: “Estar vivo implica estar sempre disponível para a(s) mudança(s)“.

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Tony Tcheka (pseudônimo de António Soares Lopes Jr.) é escritor, jornalista, ensaísta e consultor internacional (media e comunicação). Guineense, nascido em Bissau, teve o seu primeiro título publicado em Portugal no ano de 2020. Porém, antes de dedicar algumas palavras a “Quando os Cravos Vermelhos Cruzaram o Geba” (Editorial Novembro, 2020), Tcheka falou sobre “o chão da oralidade” que é a Guiné, um lugar imenso que tanto compreende o império dos bijagós, lugar onde cabe à mulher ordenar e decidir, a um outro hemisfério, onde acontece a mutilação genital feminina. Um país que está longe de ser pobre, onde “a mãe natureza é mesmo mãe, não é madrasta”. O que leva, também, a uma certa inércia, “a não querer catingar o corpo”.

“O 25 de Abril é a pedra angular de todas as histórias do livro”, disse Tcheka, falando deste conjunto de contos como uma viagem por entre “choques culturais, a vida que não pára”, o retrato de “uma fase eivada de contradições”.

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“Palavras São Imagens São Palavras” (Quetzal Editores, 2021), título impresso num loop contínuo de um pequeno livro de poemas ilustrados – ou de imagens vertidas em poemas -, foi o ponto de partida para Sérgio Godinho nos falar de poesia, da escrita de canções ou do apelo por outras formas de escrita alternativas ao formato canção. “A poesia acontece em mim de forma paralela a outras formas de escrita”. Um percurso literário cxtra-canção e para lá da poesia que começou pela prosa narrativa, prosseguiu como conto e avançou mais tarde para o romance. “Sou muito disperso por natureza. A escrita ajudou-me me na noção da continuidade de trabalho. Depois dos contos tive necessidade de me lançar em algo mais longo e persistente. De me envolver com as personagens”. Regressando aos discos e olhando para a linha temporal, Sérgio Godinho jogou no papel da vidência: “Os meus primeiros três discos estavam, sem o saber, a contar a evolução de um país: “Sobreviventes”, “Pré-Histórias” e “À Queima Roupa”. Futurologia musical, apetece dizer.

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Mais cedo, a Biblioteca Municipal da Lourinhã recebeu José Carlos Barros, prosseguindo, nas palavras de João Morales, “uma quase tradição do festival em trazer o premio Leya” – “uma avença”, brinca alguém do público. Para João Morales, a quem coube a condução da conversa, “As Pessoas Invisíveis” (Leya, 2022) é “um livro que cruza várias décadas da nossa história”, que revela uma “dimensão humanista, politica e histórica – e algumas zonas obscuras que ficam ao critério dos leitores”.

“O título não foi uma escolha minha, foi-me imposto”. José Carlos Barros fala de um livro que começou a ser desenhado com a visita a um museu, lugar onde o autor se deparou com uns painéis sobre o massacre de Batepá, que acorreu em São Tomé e Príncipe no ano de 1953 e no qual terão morrido mais de mil nativos são-tomenses. “Inquietou-me não conhecer a minha história. O que estava em causa era a recusa ao trabalho serviçal e, sem medo das palavras, trabalho escravo”. O ex-deputado e arquitecto paisagista praticante foi escrevendo entre os intervalos da vida, demorando cerca de dez anos da ideia de um livro à sua impressão.

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“Estava a escrever sobre Portugal do Estado Novo. Um país que tinha um império, depois províncias. Um país pobre, rural e supersticioso. O que sobressaiu com mais clareza foi o facto de estas pessoas não terem rosto ou importância, de serem pessoas invisíveis”. Daí o título de um livro que “deve estar cheio de imperfeições”, tendo por isso usado a prerrogativa do romancista – qualquer coisa como a 5ª emenda americana –, na recusa do género do romance histórico e procurando antes “ocupar os espaços em branco deixados pela História”.

Ainda houve tempo para alguns apontamentos sobre agricultura e culturas, a leitura de poemas escritos à máquina e com uma certa nostalgia durante a pandemia – que resultou no livro “Penélope escreve a Ulisses” (ed. Caixa Alta) -) e algumas referências musicais, algures entre o samba de guerrilha de Luca Argel e o longo caminho de Cesária Évora para São Tomé. Tudo para mostrar que a escravatura está longe de ter acabado.

O festival Livros a Oeste conta com organização do Município da Lourinhã e a curadoria do programador cultural João Morales. O programa está disponível aqui.

 

Fotos: Rita Chantre

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Pedro Miguel Silva

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