Em “Dois Finais” (Devir, 2016), o quarto volume de Kenshin, O Samurai Errante, temos a conclusão da história de Takani Megumi e da elite ninja que dá pelo nome de Oniwabanshû, a qual se encontra ao serviço de Takeda Kanryū, um industrialista traficante de drogas sem qualquer tipo de escrúpulos. A maior questão que se levantou ao longo desta narrativa prendia-se precisamente com esta estranheza em ver um grupo com o legado dos Oniwabanshû a trabalhar para um ser tão mesquinho, capaz de explorar qualquer alma – como foi o caso de Megumi. Esta questão, bem como a redenção de Megumi, são os pontos em o autor se foca nesta derradeira conclusão.
Também em termos de personagens guardaram-se as melhores para o final. Havíamos comentado, em relação ao volume anterior, que alguns destes ninjas não encaixavam muito bem enquanto membros de um grupo como os Oniwabanshû, algo que melhora substancialmente neste volume com um destaque maior dado a Han’nya e ao líder Shinomori Aoshi. Agora (sim) sentimos que estão presentes ninjas de elite, e isso é importante quando queremos criar uma aura de poder em torno de algo.
Ao relembrarmos o animé desta série – o qual passou em Portugal muito antes desta publicação -, vale a pena sublinhar que esta é uma das histórias que ganha mais em ser lida. Na animação a sua adaptação sofreu alguns cortes, nomeadamente em relação à personagem de Han’nya que, por ter um passado mais terrífico, acabou por ser censurada. No mangá assistimos, finalmente, a um merecido desenvolvimento desta personagem, tornando-a mais rica e interessante, justificando ao mesmo tempo a sua forte aliança a Aoshi. “Dois finais” é em tudo uma conclusão para todas estas histórias, mas uma em que o autor deixa espaço para o futuro.
Antes de iniciarmos numa nova aventura em “A esgrima na era Meiji” (Devir, 2016), o autor dedica os primeiros capítulos deste quinto volume a Myōjin Yahiko. Não é que estejamos perante uma das narrativas mais memoráveis desta série, mas o foco em Yahiko foi uma escolha certeira. É importante irmos conhecendo mais sobre as personagens que acompanham Kenshin, até porque com os seus respectivos desenvolvimentos também a nossa ligação a elas vai sendo maior. Sem grandes ambições temos nestes primeiros capítulos uma bonita história sobre as motivações deste rapaz, reforçando o quanto a influência destes novos amigos tem sido importante na sua vida.
Posteriormente a esta aventura avançamos para aquele que será o próximo antagonista do nosso samurai errante, Isurugi Raijuta, um samurai da velha guarda que pretende reformar – à força – todos os dojos de esgrima no Japão, unificando-os em torno do seu movimento de combate Shinko. No cumprimento deste objectivo, um aliado como Kenshin seria uma tremenda ajuda, mas os ideais dos dois são muito distintos a ponto das suas crenças colidirem, o que forçará o nosso samurai errante, uma vez mais, a desembainhar a sua espada de gume invertido.
Apesar das constantes apreensões de Nobuhiro Watsuki, espelhadas ao longo das várias notas que vai deixando, esta série continua a manter um bom ritmo narrativo, seguido por trilhos bem interessantes. As narrativas continuam a crescer e, com elas, também a profundidade das personagens. Sente-se, por vezes, alguma pressa no que toca a determinadas personagens, que acabam por ser pouco exploradas, como foi o caso de Kanryū, um vilão que ficou aquém, sendo claramente ultrapassado por uma personagem mais carismática, o ninja Aoshi. Apesar de Kanryū se provar uma personagem muito menos importante do que se poderia pensar à primeira vista, também é verdade que a imposição de Aoshi surge sempre como uma orgânica. A dada altura, o próprio leitor está tão focado nos Oniwabanshû que quase nem se lembra quem é o verdadeiro vilão da história.
Kenshin, O Samurai Errante pode ser uma aposta tardia, mas continua a ser uma sólida aposta da Devir. Cada volume traz novas e aliciantes aventuras, demostrando sempre alguma evolução por parte do autor e, se Kenshin continua a ser uma das personagens mais inspiradoras dentro deste género, a sua leitura torna-se intemporal.
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