“Houve escuridão e outra coisa, e depois acordei aqui. Isto é Gideon Falls. Mas não é. (…) Norton. Daniel. Tudo começou com ele. Ele trouxe esta loucura com ele.”
As palavras são de Angela – Angie para os amigos – Xu, e vão ao encontro do desalento sentido após o Celeiro Negro ter ardido e nada de bom ter acontecido. Pelo contrário. Quando se pensava que o fogo poria cobro à maldade que assolava Gideon Falls, o incêndio apenas terá servido para libertar o mal, dispersando a irmandade por uma série de mundos paralelos – ou, como explicita o título do quinto volume da série, “Mundos Malvados” (G. Floy, 2021).
Angie está numa dimensão que poderia bem ter sido desenhada por Orwell, isto quando este se encontrava estacionado em 1984; Clara deu por si numa espécie de western, onde há mais baratas que cavalos e gente enforcada em cima de um palco; o Padre Fred viu-se transportado para uma realidade cyberpunk, visitando uma catedral que, no lugar de sermões, hóstias e o sangue de cristo, oferece sexo em modo avulso ou em pacotes bispo para VIP`s; quanto a Norton, ninguém parece ser dele, e não será desta que o leitor irá desvendar o futuro deste herói atravessado pela bipolaridade.
Em grande parece estar o Homem que Ri, esfregando as mãos com o colapso do multiverso e a grande probabilidade de os diversos mundos colapsarem em direcção ao centro. A escuridão está à solta sem amarras, e a única esperança reside em reunir os cinco viajantes do tempo – ou, posto de outra forma, os Novos Lavradores.
Jeff Lemire e Andrea Sorrentino continuam a colocar o leitor num estado de ansiedade propenso à toma de comprimidos, mas por esta altura o que este pede é saber de que forma poderá cessar o irritante riso, daquele que foi criado quando Norton Sinclair criou a sua máquina naquele celeiro velho. E, se a história de multiversos e realidades paralelas já é território mais do que batido no mundo dos comics, o grande mérito desta série vai sem dúvida para as ilustrações de Sorrentino, as cores de Dave Stewart e o projecto gráfico de Steve Wands, que fazem com que percorrer estas páginas seja algo semelhante a visitar um museu que, sacando o título a um romance de Stendhal, está maioritariamente pintado de vermelho e negro. “The End” – título original -, o sexto e último volume de Gideon Falls, irá responder à questão que ficou pendurada: afinal, onde está o Norton?
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