Em “Essas Alegrias Violentas” (Companhia das Ilhas, 2019) estamos perante um conjunto de poemas, que se têm resumido como “um lugar onde a alegria contém em si o gérmen de uma violência que não mata mas conflagra. Aqueles que buscam essa alegria intensa não querem perder o matiz de nenhuma conflagração”.
Catarina Costa nasceu em 1985, em Coimbra, publicou vários livros entre 2008 e 2019, e editou textos em algumas revistas literárias.
O empratar de um amor por oxímoros [com o título], cheirava a presságio para uma literalidade que não tem a vital competência contraditória exigida.
Os poemas iniciam com letra maiúscula e terminam sem ponto final, num uso de expressões “engraçadas” (“dissipando-se em sentimentos daninhos”, “(…) os lampejos de uma esperança impartilhável”) e léxico relativamente complexo. Por vezes, os primeiros versos chegam para perceber o poema inteiro (“só à superfície aprendes com o erro/ dás uns passos atrás/ e repisas a raiz tensionada do equívoco”), noutros escorregamos em redundâncias (“só ao abrir os olhos o objecto da falta se delineou/ (…)/(…)/ ausente”), e ainda noutros reina uma imperceptibilidade por sentirmos falta de vocábulos (“um puro espaço negativo em que a positividade/não se podia definir invadia todo o cérebro”).
As imagens figurativas são algo previsíveis e não aprofundadas em suficiência, porque não demonstram força para sustentar o propósito sentimental ou o “quasibinómio” violência/alegria – o jogo que se pretende de contraste não tem potência discrepante bastante, e a ideia que se tenciona tatuar na memória não tem tinta, como em “Esbanjar a linguagem do amor”. Também as ironias e “reviravoltas” apesar de “bem-intencionadas”, são mal conseguidas, como no poema “A casa de gengibre”, que pede um tom final resoluto e surpreso, mas interiormente não tem conteúdo que o apoie. Bonitas ideias, mas… se temos água e flores maravilhosas, para quê oferecer feias de plástico?
O sujeito poético dirige-se a um “tu”, onde entre a primeira e a segunda pessoas, aparece, por vezes uma terceira, que várias vezes coincide com a primeira. O “nós” é transversal a toda a obra – apela a um erotismo que normalmente sucede a estas introduções algo pirosas, e depois não existe (“somos avisados”, “o prazer envolvia-nos falho de promessas”, “já não acreditávamos nas grandes coreografias conjuntas”, entre outros). Nesta obra, a dor do amor (presumível segunda “relação de natureza substituível”) vem de uma ideia de desejo não consumado, ou de um vazio de paixão que se vislumbra forçada (“não nos une nenhum centro gravítico/ nem sequer um mesmo vazio que nos sugue”, ou “imaginava-te/ e não te via imaginado:”).
O global está coberto de uma ténue beleza (“para que na fragmentação das pequenas coisas/ não haja espaço para perdas maiores); no entanto, várias ideias fogem ao nosso entendimento (provavelmente por falta de vontade nossa, numa era em que a necessidade do autor de captar o leitor ou vem do caos, ou não vem de todo), perdem encanto ou não transmitem nada por falta de conteúdo. Inicialmente queremos muito ser levados, depois o poema perde a graça – começamos em “Aquele que precisava de consolo seria, de nós dois (…)” blablabla, e acabamos em “(…) e já não sabemos sequer qual de nós dois seria o consolador e qual seria o consolado”. A obviedade prévia em conjunto com a incoerência de raciocínio não tem paraquedas que agarre os versos.
“E não irias poder abandonar-te”: também aqui o sujeito poético parece não ser mais do que partilha; ainda assim, “Sabia que se errasse cairia/ de uma altura menos elevada/ que das vezes prévias,/ o movimento em falso aperfeiçoado/ de uma coreografia complexa/ que era preciso ensaiar ao longo da vida”. Como se ensaia o viver, também se deve ensaiar o escrever. E nem um, nem o outro, devem ser uma estrada com princípio e fim pré-conhecidos, de percurso aborrecido.
Aconselha-se a leitura de “Essas Alegrias Violentas” a quem se seduz por logorreias e a quem tem sintomas de um “nós” labiríntico de problemas do sentimento (e não do pensamento).
1 Commentário
A/O Lalma Domus utiliza uma técnica desconstrutiva com uma finalidade evidente: destruir. Essa técnica pode ser aplicada a qualquer livro de poesia independentemente da sua qualidade. É muito curioso que em 2 anos de colaboração faça as suas vítimas em poetas pouco conhecidos, apesar das inúmeras publicações de poetas consagrados O medo e o respeitinho são excelentes qualidades humanas que há que preservar. Aliás, num livro medíocre e desinteressante do Vasco Graça Moura o respeitinho mantém-se. Excelente comportamento que há que enaltecer.
As outras críticas dão-lhe obviamente prazer. Sugiro que consulte um psicanalista. Caso não acredite na psicanálise (como eu), ou porque fica cara, aconselho-lhe um bom psiquiatra.