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Espíritos dos Mortos, Deus Me Livro, Crítica, G. Floy, Edgar Allan Poe, Richard Corben
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“Espíritos dos Mortos” | Edgar Allan Poe e Richard Corben

Por Pedro Miguel Silva · Em 06/05/2021

“Poe não inventou o conto, mas delineou com tanto sucesso o que deveria ser uma peça de ficção curta eficaz, que todos recorreram aos seus padrões para medir o seu próprio trabalho. Ler Poe era como ter uma magistral aula de escrita ficcional.”Espíritos dos Mortos, Deus Me Livro, Crítica, G. Floy, Edgar Allan Poe, Richard Corben

As palavras pertencem a a M. Thomas Inge, Professor de Humanidades na Faculdade Radolph-Macon, em Ashland, no estado norte-americano da Virgínia – onde ensina a escrever sobre literatura sulista, humor americano, novelas gráficas, cinema e animação -, na introdução a “Espíritos dos Mortos” (G. Floy, 2020), volume onde Richard Corben dá vida às suas histórias favoritas de Edgar Allan Poe no formato de banda desenhada – livro eleito para o Eisner Hall of Fame e vencedor do Grand Prix em Angoulême.

Até aos dias de hoje, estima-se que mais de trezentas adaptações de histórias e poemas de Poe tenham aparecido na banda desenhada e em novelas gráficas. Richard Corben, que tem dedicado grande parte do seu trabalho ao universo de Poe, é para Thomas Inge umas das referências incontornáveis, tendo conseguido trazer para a banda desenhada a “sensibilidade gótica” e o “olhar atento para o grotesco” que Poe deixou como legados literários.

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Este volume, que conta com o selo editorial da G. Floy, inclui adaptações de cinco poemas e nove contos, desenhados a cores por Corben e incluindo legendas muito expressivas e com uma costela cinematográfica alternativa de Nate Piekos. A Bruxa Mag surge como uma figura incontornável, alguém que, com humor negro e uma moral duvidosa, conduz o leitor por entre cenários de devastação, apresentando-o a personagens grotescas enquanto trata de revelar os seus dilemas existenciais através de uma experiência visual inquietante.

Espíritos dos Mortos, conto que dá título à colectânea, conta-nos a história do “jovem e formoso Solomon” e da sua “encantadora Lila”, que tem boas razões para estar feliz mas não se consegue livrar de um estado permanente de inquietação; há também um lugar conhecido como A Cidade no Mar, “onde os bons, os maus, os piores e os melhores, todos foram em busca do repouso eterno”. Um conto onde se toca ao de leve no tema da escravatura e em que o Inferno não deixa o que é seu por reclamar; A Adormecida dá pelo nome de Irene, uma amante que aproveita para consumar um amor que o tempo quebrou; as aparências iludem em O Encontro Marcado, onde um gondoleiro parece ter claramente uma agenda escondida. Por entre drogas e mistério, descemos até ao “vale profundo” com a companhia de Romeu e Julieta; Berenice é um caso de olho por olho e, mais do que isso, de dente por dente, onde um homem lamenta a morte da noiva, sua prima, que caiu morta dias antes do casamento; em Morella decorre uma relação de amor-ódio entre Morella e o marido Myron, que mostra claramente que as más apresentações podem conduzir ao precipício; A Sombra convida a partir enquanto há tempo, fugindo a uma pestilência que abriu as asas negras num ano de terror; A Queda da Casa de Usher, um “solitário edifício monolítico envolto numa manta de nevoeiro sufocante”, é a morada de Roderick Usher, que parece prender contra sua vontade a irmã, num lugar onde há caixões e outras coisas bem mais estranhas a acontecer; O Homem da Multidão lamenta o infortúnio de não se poder estar sozinho, numa convalescença que decorre após “um prolongado desequilíbrio nervoso”; Os Crimes da Rua Morgue cheira a clássico, um caso que parece insolúvel e que envolve muita massa cinzenta para o resolver; A Máscara da Morte Vermelha vê a peste entrar no reino e oferece duas soluções: distribuir comida aos pobres e oferecer-lhes condições sanitárias, depauperando o tesouro real ou, bem mais simples, dar uma festa; O Verme Triunfante apresenta-nos ao implacável coronel Mann, atacado por um verme que se banqueteava com um criado morto, e que se vai ver no centro da representação de “uma peça de esperança e temores”; O Enterro Prematuro faz lembrar uma noite de Hitchcock apresenta, aqui numa versão bem mais profana e perversa; O Corvo apresenta-nos ao jovem Arnold, um tipo dado à melancolia e a transformar em verso a vida que não tira da cabeça a ideia de que há alguém a bater à porta; O Barril de Amontilado narra uma confissão à beira de um suicídio bem regado, onde está presente alguém que tem mais sede que barriga, e que fecha esta colectânea com uma considerável grau de alcoolemia no sangue.

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As ilustrações de Richard Corben captam o universo inquietante de Edgar Allan Poe, em desenhos carregados de cor, sangue e escuridão que captam toda a essência da sua escrita, onde as personagens surgem quase sempre com o lado mais grotesco a servir de perfil.

Espíritos dos Mortos, Deus Me Livro, Crítica, G. Floy, Edgar Allan Poe, Richard CorbenEsta colectânea, originalmente publicada nos EUA pela Dark Horse a 14 de Outubro de 2014 em capa dura, viria a conhecer, a 20 de Agosto de 2019, uma segunda edição em capa mole, com uma nova ilustração para a capa e uma BD não incluída na 1.ª edição. A edição portuguesa agora editada inclui a nova ilustração na capa e a nova BD, mas chega servida na sempre recomendada capa dura.

Richard Corben (1940-2020) foi um autor norte-americano de banda desenhada, conhecido sobretudo pelos seus trabalhos de fantasia e terror, publicados maioritariamente na revista Heavy Metal. Colaborou também com editoras mainstream como a Marvel, a DC e a Dark Horse, ou com a reputada revista francesa Métal Hurlant. Foi vencedor do Spectrum Grand Master Award  e do Grand Prix 2018 em Angoulême. Em 2012, foi eleito para o Hall of Fame do Prémio Will Eisner.

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Pedro Miguel Silva

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