“Dos Romanov a Lenine” (Abysmo, 2017) – com o sub-título Relatórios de Jaime Batalha Reis sobre a sua saída da Rússia em 1918 – dá conta, através dos relatórios e documentos enviados ao nosso então Ministro dos Negócios Estrangeiros, das circunstâncias perigosas, morosas e atribuladas advenientes das fracturas politicas que conduziram à saída do Ministro de Portugal, o veterano diplomata Jaime Batalha Reis (1847-1935), da então capital russa, baptizada Petrogado em 1914, num comboio diplomático rumo a Murmansk (e daí por navio para a Inglaterra), numa épica viagem de sete semanas que resultou em muitos milhares de quilómetros e inúmeros contratempos.
Jaime Batalha Reis chegou à Rússia em 1912 para representar a República portuguesa nas comemorações dos 300 anos da dinastia Romanov, mas acabou por ficar e ser nomeado Chefe da Legação portuguesa. Assinalando o centenário da Revolução Russa, o Instituto Diplomático, a Associação dos Amigos do Arquivo Histórico-Diplomático e a Abysmo fizeram esta reedição (os Relatórios foram editados pela primeira vez em 1984), relatando os tumultos políticos e sociais do fim da monarquia e da revolução vermelha.
Como refere o actual Diretor do Instituto Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, o Embaixador José de Freitas Ferraz – que prefacia o livro -, ”o depoimento agora publicado é um exemplo eloquente da importância das fontes primárias para ilustrar a ação diplomática, num contexto de mudanças tectónicas na história europeia. Testemunha igualmente o importante acervo do Arquivo Histórico-Diplomático que reúne grande parte da nossa correspondência externa, desde 1850 até aos dias de hoje, e que no caso particular de Jaime Batalha Reis nos permite aceder ao testemunho direto de um espetador privilegiado de acontecimentos que mudaram o curso da história mundial.”
Um estudo introdutório do historiador Pedro Aires Oliveira, sobre as vicissitudes da missão diplomática em terras russas – muitas vezes em situações-limite sem notícias de Portugal, numa conjuntura muito crítica do século XX após a tomada do poder pelos bolcheviques -, lança uma renovada perspectiva sobre este histórico momento de poder instável, que se ressentiu das perspectivas antagónicas dos vários actores revolucionários relativamente à continuidade do país na Primeira Grande Guerra. Após a mal-sucedida ofensiva de Kerensky, a cidade de Petrogrado esteve na iminência de ser capturada pelo exército alemão. Numa atmosfera de privações, pânico e anarquia generalizada, as imunidades dos agentes diplomáticos e legações estrangeiras deixaram de estar garantidas e eram obrigadas negociar entre o Exercito Vermelho e o Exército Branco para uma saída da Rússia em condições de alguma segurança.
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