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Dionísias - As celebrações, D. H. Machado, Deus Me Livro, The Poets and Dragons Society
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“Dionísias – As celebrações” | D. H. Machado

Por Lalma Domus · Em 26/02/2019

“Dionísias – As celebrações” (The Poets and Dragons Society, 2018) é uma colecção de poemas, que pretende representar celebrações em três momentos longos e um pequeno treno dedicado a Garcia Lorca, num ritmo alucinante em imagens sequenciais de violência intersubjectiva com carga emocional e sexualmente explícita. Uma obra com “leite ensanguentado de fetos renascidos”.

H. Machado nasceu em Lisboa no ano de 1974. Começou a escrever poesia aos 12 anos e fê-lo ao longo de toda a sua adolescência. Após os 20 anos dedicou-se à vida académica e profissional, onde “O Aprendiz” marcou o seu regresso à escrita. Em 2003, foi-lhe atribuído o Prémio Revelação Cesário Verde por esta obra, “Dionísias- As celebrações”, escrita quando tinha apenas 19 anos.

Num paralelo ao prefácio, sentámo-nos confortavelmente no chão com o livro “Dionísias- As celebrações” numa mão e uma caneca de chá verde de marca branca na outra. No telemóvel (porque não temos classe para ter gira-discos) ninguém anunciava que uma cerimónia iria começar.

Estamos perante uma obra grávida de originalidade. De pré-salientar que aceitamos sempre experiências catatónicas, sem qualquer antepaixão: às vezes até sabem bem, especialmente quando são “no útero do rio onde o velho urina em suaves gargalhadas”. Ainda assim, após leitura desta obra sentimo-nos vazios, porque percebemos aproximadamente patavina. O que atingimos, de certeza, é que o absinto e o fornicar são como deuses e “jesuses” que estão sempre entre nós: um bem-haja à “palavra fornicadora” e aos “fetos de absinto”.

Se os rituais dionísios eram cultos que contradiziam e ultrapassavam a ordem social e humana convencional – sim, lá isso esta obra é uma derivação também. Nestes poemas ouvimos “ecos do caos e da destruição” – em formato de repetição, ou sussurro premeditado. Literal, mas também figurativamente. Os ecos fazem a tal harmonia que nos permite categorizar certos poemas nesta obra como “poemas sinfónicos”, instituídos “onde o leite materno ainda escorre” (tanto na página 37 como na 92).

Dionísias - As celebrações, D. H. Machado, Deus Me Livro, The Poets and Dragons SocietyNão temos métrica regular, nem esquema rimático constante. Em certos poemas denotamos uma estrutura no número de versos como em “olhai a carranca que passa pela rua”, com cinco estrofes sétimas. O ritmo é assinalado por uma dualidade de pujança, com prenúncios de ansiedade e durabilidade nervosa (“a palavra bateu na terra”, “as mães agitam os lenços brancos em cinza esquecidos”) e cansaço agitado a suspender o antagonismo lexical (especialmente em “sentado num cais distante” ou em “os punhais cravados no teu ventre”). Os poemas são ricos em alegorias, repetições lexicais (“corvo”, “erecto”, “sangue”, “morto”, entre outras) e outras figuras de estilo típicas da contemporaneidade (aliterações como em “eis o momento/ eis a morte em movimento” ou em “perdida entre ventanias ventaneiras e ventosidades”, por exemplo), sendo que tudo são imagens e injecções visuais. Tal como em “O Aprendiz”, também aqui a pontuação e as maiúsculas inexistem. Mas não faz mal porque falamos de “onde o sangue materno ainda desliza” (ainda bem que não é sempre o leite).

Em certos poemas ficamos com um desejo frenético de gritar, noutros de perceber, noutros de parar de ler. É verdade que as coisas boas se diluem porque a “terra fornicada pelas guerras” é complicada de manter num nível aprazível. Ainda assim há versos grandiosos que pretendemos guardar na nossa caixinha de “expressões para usar depois” como “a terra fenece sob os meus pés”, ou “onde o leite materno ainda escorre” (que sabe melhor na página 92 que na 37).

Uma golfada de motivação envolve-nos num desejo de grandeza bacorejada com a leitura de certos versos (“sinto porque a lua brilha/ sobre as minhas lágrimas de neve/ porque os meus olhos são as estrelas/ o meu rosto o sol). Crescemos com o ânimo, mas depois relembramos aquele que “roubava o leite das grávidas” e “as mães choravam lágrimas de leite” e o fomento dissolve-se pelo, como diria o autor, ventre.

Estes poemas são crus e “são anjos que gritam como cães espancados”.

Aconselha-se a leitura de “Dionísias – As celebrações” a quem gosta de retirar conotações sexuais subentendidas com traços de violência estimulante e a quem tenta incitar ao rebuliço interior próprio proveniente do leite materno.

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Lalma Domus

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