“Como Poeira ao Vento” (Porto Editora, 2022), do cubano Leonardo Padura, é um livro onde tudo o que acontece tem uma causa política, embora não fale de política directamente. Conta-se a história de um grupo de amigos cubanos, do exílio da maior parte deles, dos que ficaram no país e da amizade que os une – a história de uma geração, mas também a história contemporânea de Cuba. A maioria das personagens sai do país, por razões pessoais, profissionais, sentimentais, económicas, nenhuma por motivos claramente políticos, embora tudo seja por razões políticas. São pessoas que se conhecem desde a universidade, engenheiros, médicos, arquitectos, físicos, e que mantiveram sempre uma relação muito próxima.
A acção do romance decorre entre 1989 e 2016, retratando a contemporaneidade de uma geração que se exila por liberdade, em fuga ao padrão moral e comportamental imposto pelas necessidades do regime político. Alimentado pelos diversos êxodos migratórios que têm ocorrido, este romance de Pandura funciona como contra-memória, realçando outros valores, personagens e momentos históricos que são frequentemente omitidos, negados ou desvirtuados pelo discurso oficial, descontinuidades e rupturas que a história também guarda, realçando as diferenças entre as consciências colectivas e os temas mais marginais.
“Como Poeira ao Vento” deve ler-se como um romance, embora em muitos aspectos assuma contornos de um documento político – ou até sociológico. Os acontecimentos históricos referidos são reais, mas a sua presença no romance é assumida na perspectiva da ficção. As personagens e as suas histórias surgem inspiradas em casos reais, em biografias não fictícias. Igualmente reais são os locais onde se move o enredo. Na perspectiva do autor, a obra de imaginação foi convocar todos os elementos históricos, humanos e físicos de uma época e dar-lhes a forma de um romance. O leitor sente que recebe um romance profundamente alimentado pela realidade, sentindo-se ainda testemunha das vicissitudes individuais e do compromisso do autor relativamente a uma realidade que, por muito romanceada e adaptada que esteja, é tremendamente pessoal.
Leonardo Padura nasceu em Havana, em 1955. Romancista, ensaísta e jornalista, considerado um dos melhores autores de Cuba, escreveu argumentos para o cinema. Licenciado em Filologia, trabalhou como guionista, jornalista e crítico, conhecido pela série de romances policiais protagonizados pelo detective Mário Conde. Diversas vezes premiado, foi em 2012 reconhecido em Cuba pelo conjunto da sua obra e, em 2015, galardoado com o Prémio Princesa das Astúrias das Letras.
“Como Poeira ao Vento” completa um ciclo que começou em 2001 com a obra “O Romance da Minha Vida”, que conta a história de José Maria Herédia, poeta do século XIX que tem de se exilar devido às suas ideias independentistas. Já nesse livro Padura conta os dramas dos exilados, de quem tem de começar de novo a vida noutro país. Em 2015, um dos episódios desse livro é escolhido para a história do filme “Regresso a Ítaca”, onde se fala dos exilados. Ainda assim, nunca tinha desenvolvido o tema de uma forma tão profunda como o faz agora, neste romance, num registo de perseverança que assume como pessoa e como escritor.
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