“Tantas coisas tinham mudado desde a revelação do seu legado como filha do Rei Outonal e herdeira Estelar: pessoas especadas a observá-la, o chapéu e os óculos que agora usava na rua para conseguir algum nível de anonimato, o emprego nos Arquivos Feéricos. Mas não a sua mãe, ela continuava igual. Bryce não conseguia decidir se isso era um conforto ou um incómodo”.
Sejam bem-vindos a “Casa de Céu e Sopro” (Marcador, 2024), o segundo livro da série Cidade da Lua Crescente, mais um tour de force pelo universo da fantasia assinado pela norte-americana Sarah J. Maas. Bryce Quinlan e Hunt Athalar salvaram a Cidade da Lua Crescente – e talvez o mundo -, recebendo a garantia da parte dos asteri de que seriam deixados em paz – se, do seu lado, não levantarem grandes ondas e se limitarem a ficar quietinhos, estilo bibelôs. Para complicar as coisas, fizeram um acordo de que provavelmente estarão ambos arrependidos, mas que na altura até que nem soava mal: “em vez de irem direitinhos para a cama, esperariam até ao Solstício de Inverno para concretizar os seus desejos. Passar o verão e o outono a conhecerem-se melhor sem o fardo de um arcanjo pesicótico e de demónios a deambular pelas ruas”.
O cenário de calma é, porém, pura aparência. Basta dizer que Bryce se vê envolvida num casamento combinado, que está para breve a nomeação de uma nova Governadora e que, para mal dos pecados de Hunt, outros triários se instalaram na cidade, velhos conhecidos que este considera “a escória do universo”.
Num livro onde Sofie, alguém que “tinha sobrevivido a duas semanas no campo de extermínio de Kavall”, serve de ponto de partida a uma história de rebeldia, Maas junta-lhe uma série de ingredientes que ajudam a subir a temperatura da série: a estrela brilhante de Bryce, capaz de brilhar nos momentos mais indesejados; os ceifadores, capaz de conduzir barcos sem remos e sem leme embalados por uma brisa-fantasma; os pássaros-trovão, caçados sem piedade pelos asteri, “demasiado perigosos e voláteis para que lhes fosse permitido viver”; o Dia da Morte, de clara inspiração mexicana, “um dia de equilíbrio entre a luz e a escuridão, queando o véu entre os vivos e os mortos era mais fino”; Apollion, o Príncipe Estelas, que vê em Bryce o seu adversário de eleição; Ruhn, a dar cartas como agente telepático secreto; uma caça ao chifre tatuado, missões debaixo de água e um cenário de uma república inter-espécies.
Para não variar, Sarah J. Maas conduz-nos pela mão ao topo da montanha, para sem aviso nos empurrar encosta abaixo – mas só depois de sorrateiramente nos ter cortado os travões. O final é vertiginoso, com tanto de genial como de louco, levando-nos a pensar que, desta vez, Maas poderá ter dado um passo maior do que a perna. Por outro lado, se há alguém capaz de se safar desta incrível embrulhada, esse alguém é Sarah J. Maas. A prova dos nove vai ser feita em “Casa de Chama e Sombra”, o terceiro livro da série (já disponível nas livrarias).
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