Chegados aos dois últimos volumes da Biblioteca de História Larousse, que vão da Revolução Francesa de 1789 até aos dias de hoje, pode dizer-se que o cenário está longe de ser animador para a Humanidade, ainda que pareça subsistir uma réstia de esperança gerada por uma cuidada observação do passado. Ainda há dias, Stephen Hawking foi tratando de dizer que o melhor a fazer será mesmo procurar outros planetas habitáveis – ou torná-los habitáveis -, uma vez que, dentro de mais ou menos mil anos, a Terra terá defechar portas.
Recuando ao século XIX e à “História do Mundo no Século XIX” (Círculo de Leitores, 2016), Theodore Zeldin, professor na Universidade de Oxford e prefaciador e organizador deste volume, trata de fazer cair alguma sombra sob o século que está na origem da modernidade:
“Já não é possível considerar o século XIX como uma época heróica. É certo que cada geração tem a tentação de mudar de opinião sobre o passado, como fazem certas crianças que, depois de crescidas, têm uma ideia dos pais diferente da – idealizada – da sua juventude, enquanto outras recusam essa lucidez e preferem viver com recordações emprestadas. Seja como for, hoje é impossível continuar a acreditar na ideia de que o século XIX se fazia por si só.”
Trata-se, segundo Zeldin, de um século tremendamente convencido e que quase sempre avançou de nariz empinado, numa ideia de aperfeiçoamento constante – a certa altura é uma tentação fazermos a ponte com o mercado de capitais e a busca de lucro que tomou conta dos dias de hoje. Zeldin traz também para estas páginas Alexander Von Humboldt (1769-1859), considerando que terá sido o último homem deste século a ter uma visão geral de todas as civilizações e ciências.
Tratou-se de um século onde, apesar de se sonhar com a paz, se acreditou acima de tudo nas virtudes da guerra, despoletando nacionalismos e ódios que viriam a perdurar no tempo. Uma época de contrastes, como aquele que opôs a felicidade pessoal à solidão interior, ou que colocou a cura diante de um surto geral de hipocondria. Um tempo que levou a uma mania de classificar, de diferenciar pessoas e grupos, mas que, por outro lado, foi também o século da busca da beleza e da verdade através da arte, na ciência e na literatura.
Viajamos entre a Revolução Francesa de 1789 e as revoluções russas de 1905 e 1917, numa cronologia por onde passam a independência da Grécia em 1722, a conferência de Berlim que organizou a colonização de África, a construção da Estátua da Liberdade, as teorias sobre a evolução de Darwin. Um século que assistiu ao nascimento dos caminhos-de-ferro, da electricidade, das vacinas, da máquina de costura ou dos arranha-céus. E que, segundo Zeldin, deverá servir de lição pessoal a quem ler esta “História do Mundo no Século XIX”:
“Ao longo dos acontecimentos descritos neste volume da História do Mundo, os leitores podem descobrir-se a si mesmos e compreender mais claramente o que aceitar e o que desafiar.”
Chegados à “História do Mundo Contemporâneo” (Círculo de Leitores, 2016), o cenário descrito por Jean-Pierre Rioux está longe de ser animador:
“O século XX, nascido no sangue da Grande Guerra de 1914-1918, morreu antes do seu termo, entre 1989 e 1991, com a derrocada espectacular, mediatizada, tão pouco violenta e tão pouco chorada, da sua última ideologia mortífera, o comunismo.”
Desde o Tratado de Versalhes aos nossos dias, Rioux pinta um percurso negro, marcado pela “tragédia inacreditável, o progresso unificador, a desigualdade crónica e a insensatez manifesta.” O autor defende ainda que este volume deverá ser lido de machado na mão, e que o século XX deverá ser, depois de arrumado, uma fonte de iluminação para o indeterminismo do nosso presente.
Não é, se olharmos bem, um século feliz. Por ele passaram duas guerras mundiais e inúmeros conflitos – Vietname, Médio Oriente, Ex-Jugoslávia, Iraque -, fazendo do planeta um permanente campo de batalha. Um século onde as grandes figuras passaram a ser os deuses dos estádios e aqueles que vão passando por pequenos e grandes ecrãs. Um tempo que preparou o boom da informação que levou à perda da privacidade. Supermercados, fast food, frozen food, produtos biológicos. What’s next?, apetece perguntar. Uma colecção essencial da História do Mundo em cinco volumes que, mais do que respostas, procura levantar dúvidas e fazer do passado uma lição para o futuro.
“Decididamente, o século XX não parou de soterrar o homem ocidental. As novas tecnologias e os novos dramas rebentaram com os patrimónios, com as comunidades e os grupos sociais. Compete-nos, a partir de agora, dizer se os escombros que ficaram, bem explorados e cuidadosamente seleccionados, poderão servir para reconstruções.”
Outros volumes:
História do Mundo Antigo
História do Mundo Medieval
História do Mundo na Idade Moderna
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