Está de regresso às livrarias portuguesas o imprevisível e sempre divertido David Walliams, o escritor britânico que, com o seu lado irreverente e educacionalmente incorrecto, gravita no mesmo universo legado à literatura infanto-juvenil por Roald Dahl.
“As Piores Crianças do Mundo” (Porto Editora, 2017), servido uma vez mais em capa dura e com as ilustrações coloridas de Tony Ross, reúne dez contos de dez crianças que poderiam bem ter sido convidadas para uma visita guiada à fábrica de Willie Wonka, perdendo-se algures pelo caminho devido ao seu feitiozinho.
A introdução do livro está a cargo de Raj, o lojista, personagem que tem aparecido em praticamente todas as histórias de Walliams e que faz dele uma espécie de guru espiritual com produtos fora de prazo. Ele que, na sua linguagem muito própria, se refere ao livro como “uma péssima influência para mentes jovens“, composto por “uma catrefada de histórias sobre crianças cujos rabiosques não páram de dar puns, crianças que ensinam as suas lêndeas a fazerem coisas terríbeis e crianças que não páram de meter o dedo no nariz até tirarem de lá a maior catota do mundo“.
São, de facto, dez espécimes da invulgar condição humana, um pequeno zoológico de tiques e manias que desde muito cedo o Homem vai tratando de cultivar mas que, a certo ponto da viagem existencial, deveriam ser deitadas fora (ou na reciclagem se houvesse contentor para tal).
Walliams escolheu assim as dez piores crianças do mundo: João Babão, um rapaz que dormia nas aulas e tirava más notas, que conseguia produzir litros e litros de baba por dia, uma baba “transparente como água, mas espessa e peganhenta como cola“; Fiona Chorova, com apenas 8 anos mas uma vida de muitas lágrimas, que tinha um irmão mais novo a quem culpava por tudo e por nada de modo a sacar sobremesas extra; Rui o Rapaz-Lêndea, responsável pelo surgimento da Sra. Andrade, a primeira lêndea que se tornou um animal de estimação, e que tem o desejo de ser um super-vilão (o Rui, não a lêndea); a Menina Bina Traquina, que não conseguia parar um minuto quieta, o que não ajuda nada se estivermos no melhor museu de porcelana da Europa, recheado de antiguidades de preço inestimável; Joca Ranhoca, sempre com (pelo menos) um dedo metido no nariz, “o deus de tudo o que fosse verde e pegajoso“, que tinha como sonho entrar para o Guiness produzindo o maior macaco de todos os tempos; Bé Chulé, seguida constantemente por “uma enorme nuvem de pó e sujidade e mau cheiro“, cujos pés “cheiravam ainda pior do que queijo da serra passado do prazo há anos“; Ling Furtado, um rapaz que apresenta uma costela Cavaquiana: nunca, mas nunca está errado; Rosa Ventosa, que “possuía um talento incrível para soltar gases. Puns, traques, gaitas gasosas, bufas, sinfonias de sanita, pantufinhas, arrotos de rabiosque, pusetes, explosivos, falsetes…“; Beto Correcto, que “tinha chegado aos 12 anos de idade sem sorrir uma única vez” e que, para além de uma colecção de aparas de lápis, tinha como maior passatempo tentar adivinhar os diversos tipos de metal que compunham vários objectos, enquanto vestia a mesma indumentária composta por sapatos cinzentos, calças cinzentas e camisa cinzenta (e provavelmente roupa interior cinzenta); e, por último, Sofia Sofá, que nunca ia à escola mas nem por isso ajudava a mãe em qualquer tarefa, ou sequer se levantava para comer à mesa. O seu mundo era o do sofá e da televisão.
Escondendo máximas e apontamentos de moral como “da próxima vez, assoa-te” ou “arruma o teu quarto ou vais acabar engolido“, “As Piores Crianças do Mundo” apresenta uma colecção de histórias muito divertidas e irreverentes, que sugerem que alguns comportamentos possam ficar esquecidos na meninice, sob pena de uma vida adulta miserável. No final fica prometida a edição de um novo volume: palavra da secretária de David Walliams.
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