Em Fevereiro de 2014, Kent Haruf foi diagnosticado com uma doença grave, tendo recebido a notícia de que teria apenas mais alguns meses de vida. Com cinco romances publicados até à data, ainda conseguiu reunir forças para escrever um sexto, tendo falecido pouco tempo depois de entregar as últimas correcções do texto à editora.
Recentemente adaptado ao grande ecrã, “As nossas almas na noite” (Alfaguara, 2017) é um livro breve, terno e cruel sobre as segundas oportunidades, que aqui surgem no ocaso da vida e numa comunidade e família regidas por códigos morais, onde qualquer desvio à regra é visto como uma afronta ou um escândalo.
Estamos em Holt, uma pequena cidade do Colorado. Addie Moore, viúva, faz uma visita ao seu vizinho e também viúvo Louis Waters, levando consigo uma estranha proposta: que, a partir desse dia, este passe a dormir em sua casa, para terem ambos com quem conversar durante a noite. Depois da estranheza assentar, Louis aceita o repto e, aos poucos, vão desenvolvendo uma inesperada intimidade, revivendo os sonhos da juventude, recordando a atmosfera agridoce dos seus casamentos, antecipando uma recta final da existência passada lado a lado.
A escrita de Kent Haruf deixa de lado o artifício e abraça a contenção, expondo toda uma sociedade que assenta na ideia de que a velhice está condenada à decência, impedida de experimentar ainda a poesia que a vida encerra muito perto do pôr-do-sol. Uma despedida do mundo feita com muito estilo e sabedoria.
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