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Arsène Lupin: depois da série, o cavalheiro-ladrão tomou conta das livrarias

Por Pedro Miguel Silva · Em 20/09/2021

É costume dizer-se que uma imagem vale mais do que mil palavras. No caso de Arsène Lupin, as imagens serviram de mote ao surgimento das palavras, e tudo à boleia de uma série televisiva, com Omar Sy no papel principal. Estreada este ano na plataforma Netflix – e já com duas temporadas -, Lupin foi uma das séries mais vistas este ano, tendo liderado o top diário de streamings em países como Portugal, Brasil, Argentina, Itália, Espanha, Holanda ou Suécia.

Aproveitando o sucesso da série – e o facto de os direitos de publicação estarem disponíveis a custo zero -, muitas foram as editoras nacionais que se dedicaram a publicar as aventuras de Arsène Lupin, personagem de ficção criado há mais de um século por Maurice Leblanc. Alguém que incorpora a perspicácia de Sherlock Holmes, a loucura romântica de Dom Quixote e o espírito travesso e popular de Robin Hood, ficando conhecido nas entradas das enciclopédias literárias como o cavalheiro-ladrão. Aliás, Sherlock Holmes é uma presença mais ou menos regular nas aventuras de Arsène Lupin, que para não criar confusões de identidade surge como Herlock Sholmes.

CAPA_ladrao de casaca leyaA colectânea de nove contos, inicialmente publicados na revista Je Sais Tout, resultou em diversas edições, que receberam títulos diferentes. A edição da Leya, com a lombada cozida, sem corte de guilhotina e as páginas por abrir, ao estilo de um manuscrito antigo, intitula-se “Ladrão de Casacas”, enquanto a Porto Editora optou por um “Cavalheiro Ladrão”, num design que serve de base aos diversos títulos que a editora já lançou e irá lançar. A Ideia-Fixa tinha já publicado esta edição em 2015, chamando-lhe então “Gentleman-gatuno”.

Trata-se do livro que serve de cartão-de-visita a Arsène Lupin, e que nos transporta até França no início do século XX, com a Belle Époque em alta e Paris chegando-se à frente como uma cidade cosmopolita, onde cultura e diversão são o prato principal de cada dia. É neste mundo que entra em cena Arséne Lupin, o ladrão dos mil disfarces, com tanto de carismático como de sedutor, onde a falta de escrúpulos se vê compensada pelo sentido de humor, a elegância e um código de honra bem diferente dos manuais.

Nestas nove primeiras histórias, viajamos num transatlântico, onde todos se divertem a adivinhar quem será Lupin, que terá subido a bordo com um ferimento; entramos no castelo feudal de Malaquis, uma fortaleza impenetrável – e recheada de tesouros -, que não parece ser um desafio complicado para Lupin, mesmo que se encontre na prisão. Afinal, “para Arséne Lupin existirão portas, pontes levadiças, muralhas?”; acompanhamos a crónica de uma fuga anunciada, vendo Lupin exposto pelos olhos do povo – “pela sua originalidade, a sua boa disposição, a sua diversidade, o seu génio inventivo e o mistério da sua vida” e da justiça – “uma mistura bizarra de inteligência e perversão, de imoralidade e generosidade”; procuramos o colar da rainha, onde um ladrão nos mostra que se pode voltar ao lugar onde se foi feliz; ficamos a conhecer a forma como Lupin e o narrador das aventuras se conheceram, tornando-se “o seu muito humilde, fiel e grato historiógrafo”; ficamos de olho no cofre da Sra. Imbert, onde através de um plano perfeito se ganha confiança e uma lição para a vida; descobrimos a pérola negra, numa história onde se aprende a “ser mais silencioso do que o silêncio, mais invisível do que a noite”; e, a terminar, assistimos ao primeiro assalto contra Herlock Sholmes, que gira à volta de dois livros antigos e da procura por um subterrâneo secreto.

CAPA_a-agulha-oca“A Agulha Oca” (Porto Editora, 2021), publicado em 1909, transformou-se com o tempo no mais famoso livro de Maurice Leblanc. A trama arranca a cem à hora num castelo em Ouville-la-Rivière, “outrora residência abacial dos priores de Ambrumésy, mutilado pela Revolução, restaurado pelo conde de Gesvres, a quem pertencia há vinte anos”, e no qual este vive “com a sua filha Suzanne, uma criatura bela e frágil de cabelos louros, e a sua sobrinha Raymonde de Saint-Véran, que ele acolhera dois anos antes, depois de a morte simultânea do pai e da mãe a ter deixado orfã”. É aqui que vemos decorrer um roubo onde, aparentemente, nada foi roubado, acreditando-se que o assaltante terá sido atingido e se tenha escondido nas imediações. Um assaltante que, segundo Isidore Beautrelet, um aluno de Retórica disfarçado de jornalista, é precisamente Arséne Lupin. Na companhia de Ganimard, um “vasculhador, paciente e polícia calejado”, e também de Herlock Sholmes – que nutre um ódio de estimação por Lupin -, tudo fará para deitar as mãos a Arséne Lupin, o grande aventureiro, o rei dos ladrões, por quem não deixa de mostrar uma grande admiração: “Tudo o que ultrapassa a média merece ser admirado. E ele paira acima de tudo. Há nesse vôo uma riqueza de concepção, uma força, um poder, uma destreza e uma desenvoltura que me arrepiam”.

Numa perseguição implacável movida por Beautrelet, que parece conhecer demasiado bem o jogo de Lupin, haverão raptos, desaparecimentos, ameaças, ataques e mortes, tudo para descobrir onde se esconderá Lupin e, também, o misterioso lugar que há séculos tem servido para esconder a fortuna dos reis de França, desde a época de Júlio César até ao reinado de Luís XVI. Um livro muito bem desenhado onde, para lá de estar sempre um passo à frente dos adversários, Lupin mostra a sua costela de cavaleiro andante, tentando provar que nem sempre quem tem sorte ao jogo se estampa ao comprido nos jogos de amor.

CAPA_o ultimo amor de arsene lupin“O Último Amor de Arsène Lupin” (Asa, 2021) é um romance póstumo, inédito em Portugal, que nos mostra um Lupin muito diferente. O exemplar dactilografado foi encontrado sem ter sido corrigido na totalidade por Leblanc, mas acabou por ser editado sem qualquer modificação, por acordo com a família e as edições Balland. Um livro no qual Lupin, já numa fase avançada da vida e com um largo mealheiro, exerce a função de pedagogo e mestre, até entrar em cena Cora de Lerne, que parece estar destinada a usar a coroa de rainha. Intriga, pistas falsas, traições e muito jogo de cintura, na história que serviu de despedida ao cavalheiro-ladrão.

Maurice Leblanc nasceu a 11 de Dezembro de 1864, em Rouen, no seio de uma família abastada. Apesar das oportunidades de estudo em França, na Alemanha ou em Itália, decidiu interromper o curso de Direito para se tornar jornalista e escritor, depois de uma curta experiência de trabalho na empresa familiar. Estabeleceu-se como repórter policial do jornal L’Écho de Paris e publicou Une femme, um romance psicológico, aos 23 anos, bem acolhido pela crítica mas ignorado pelos leitores, assim como o foram os livros seguintes. Foi Arséne Lupin que o tornou famoso, personagem que surgiu de um convite do editor da revista Je sais tout, para publicar histórias de um detective que pudesse rivalizar com o perspicaz, algo sério e muito brit Sherlock Holmes. A grande inspiração para Lupin acabou por ser Marius Jacob, um anarquista francês considerado um ladrão inteligente, com sentido de humor e generosidade. Morreu de pneumonia em 1941, aos 76 anos, em Perpignan, para onde se retirara em 1939, depois da invasão alemã. Vários dos seus vinte e quatro romances policiais foram adaptados ao cinema e ao teatro.

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Pedro Miguel Silva

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