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Ao Ritmo de Harlem, Colson Whitehead, Alfaguara, Deus Me Livro, Crítica
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“Ao Ritmo de Harlem” | Colson Whitehead

Por Pedro Miguel Silva · Em 03/01/2023

“Gosto de variar o tema. De cada vez que escrevo quero fazer algo de novo. Apanho as minhas ideias de todo o lado, desde os jornais ao twitter, à vida real”. As palavras pertencem a Colson Whitehead, e foram proferidas em Outubro último quando esteve na Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD). Uma conversa conduzida pela jornalista e escritora Isabel Lucas, centrada em “Ao Ritmo de Harlem” (Alfaguara, 2022), o primeiro volume de uma trilogia criminal publicado pela Alfaguara – editora que havia lançado os dois outros títulos de Whitehead disponíveis no mercado nacional: “A Estrada Subterrânea” e “Os Rapazes de Nickel”.

Para aqueles que tiverem lido (apenas) “A Estrada Subterrânea” e “Os Rapazes de Nickel”, “Ao Ritmo de Harlem” poderá assemelhar-se a um estranho objecto: no lugar de uma ferida aberta – ou, pelo menos, exposta ao olhar -, descobrimos um bairro pulsante dominado por pequenos trafulhas, episódios com uma mistura bem doseada de comédia e tragédia e muita – mesmo muita – conversa sobre mobiliário.

O protagonista dá pelo nome de Ray Carney, vendedor de mobília, pai de família, homem aparentemente pacato e engenhocas, que a ter um cartão-de-visita diria qualquer coisa como isto: “Qualquer peça que precise, seja qual for o modelo, preços em conta”. Por detrás desta pacatez, porém, esconde-se uma linhagem familiar tremendamente rufia, plenamente encarnada pelo irmão Freddie – “sobrava-lhe em sorte o que lhe faltava no resto” -, que mostra um cada vez menor jogo de cintura para lidar com esquemas trapaceiros e pouco recomendáveis – ao contrário de Ray, que vai fazendo um bom dinheiro com esquemas laterais e não declarados.

Diplomado em Gestão, Ray sobrevive num mundo onde a condição de se ser negro é uma nódoa no currículo e na vida. À boleia dos esquemas de Freddie, ver-se-à atirado para um lugar do qual não poderá regressar, e do qual fazem parte polícias corruptos, subornos a rodos, esquemas de vingança e crimes apagados com a ajuda da carteira – se esta estiver recheada.

Ao Ritmo de Harlem, Colson Whitehead, Alfaguara, Deus Me Livro, Crítica

Apesar de conter menos dramatismo que os anteriores romances publicados em Portugal, “Ao Ritmo de Harlem” mantém a contestação política e o olhar histórico de Whitehead, para quem o racismo continua a ser uma presença forte num país que, vai-se a ver, talvez não esteja longe disto: “A América era vasta, infestada de lugares pouco recomendáveis, onde a intolerância e a violência raciais reinavam. Vai visitar familiares na Geórgia? Eis uma lista dos trajectos seguros, que não atravessam as cidades onde os negros estão sujeitos a recolher obrigatório ou os territórios de brancos de onde poderá não sair vivo, as vilas e distritos a serem evitados caso preze a sua vida”.

Numa viagem que atravessa clubes elitistas, um bairro em ebulição, um mistério policial, o apogeu dos movimentos civis, motins e pilhagens, crimes e castigos, o leitor será apresentado a um homem com o desejo de criar família e de subir na vida, adaptando-se aos corredores do poder, a uma lei escorregadia e a uma “cidade que não perdoa”. Uma coisa é certa: o leitor sairá daqui pronto a entrar, como um expert, numa loja finória de mobiliário antigo.

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Pedro Miguel Silva

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