Quando, em 1936, Munro Leaf (1905-1976) escreveu “A História de Ferdinando” (Kalandraka, 2016), estaria certamente longe de imaginar que décadas mais tarde as touradas seriam postas em causa, olhadas por muitos como uma cruel e fortuita demonstração de tortura que recuperava o tempo dos gladiadores e da violência como divertimento sádico.
Munro especializou-se em Literatura Inglesa, tendo sido professor e editor. Das quase 40 obras que escreveu ao longo de quatro décadas, “A história de Ferdinando” é a mais conhecida, que resultou de uma colaboração com o ilustrador Robert Lawson (1892-1957) – com quem já havia trabalhado em “Wee Gillis”, livro premiado com a Medalha Caldecott em 1939.
“A história de Ferdinando” tem como protagonista um pequeno touro chamado Ferdinando, que está longe de partilhar as brincadeiras dos outros touros da sua idade: correr, saltar e dar marradas. Para ele, o sossego e as flores são a ideia de uma vida bem vivida, e tudo parecia perfeito até que o destino – e uma abelha – o conduzem às corridas de Madrid, sendo apontado como o touro mais feroz e perigoso de todos os touros. À sua espera na arena encontra o Matador, mas as coisas não irão correr propriamente como todos estavam à espera. Bem, todos menos o Ferdinando.
Mora aqui uma história pacifista e anti-bélica, como se Ferdinando fosse um touro hippie, embebido do espírito flower power, para fazer frente à violência do mundo. A prosa está impregnada de lirismo, rejeitando a violência mas, também, fazendo a apologia da liberdade individual e do respeito pela diferença.
Traduzida em mais de 60 países, não faltam episódios curiosos a esta história: se Gandhi a tinha como um dos seus livros favoritos, já Hitler ordenou que todos os seus exemplares fossem queimados na Alemanha. Em Espanha, o livro foi proibido por ser considerado uma crítica à Guerra Civil que atravessava o país.
As ilustrações a preto e branco alternam entre o lado panorâmico e os grandes planos, sempre atentas ao detalhe. Em 1938, a Disney fez uma adaptação que ganhou um Oscar para a melhor curta-metragem de animação.
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