Foi livro finalista do Prémio Booker Internacional 2023 e, muito provavelmente, ficou a um danoninho de fazer a festa. Assinado pela mexicana Guadalupe Nettel, “A Filha Única” (Dom Quixote, 2024) é um romance a três vozes sobre a maternidade, propondo um olhar sobre as várias possibilidades de construir uma família num mundo em mudança.
No coração do romance estão três mulheres: Alina, mulher que, depois de atingir os oito meses de gravidez, fica a saber que a sua filha não irá sobreviver ao parto; Laura, a grande amiga de Alina, para quem a gravidez é uma espécie de “grilheta humana”; e Doris, mãe solteira de um filho com sérios problemas de comportamento.
Através deste triângulo de mulheres, a que pelo caminho se juntam outras tantas, Guadalupe Nettel estilhaça a ideia pré-concebida de maternidade, começando por questionar, através de Laura – a bravíssima narradora -, o lugar da sua tentação: “Precisava de as entender, de saber se tinham realmente escolhido aquele destino ou se, pelo contrário, acatavam resignadamente uma exigência familiar ou social. Que peso tiveram as suas mães, os seus parceiros, as suas amigas nessa decisão?”.
É um olhar incisivo, poderoso e terno sobre a experiência da maternidade, que revela a falácia da família biológica ou se diverte a brincar com a atribuição de nomes ou os géneros, explorando também as relações que estabelecemos com o outro, caminhando num arame entre a vida e a morte. As perguntas são muitas, mas esta é claramente uma das que ficarão com o leitor: “Mas como fugir de algo que nos assusta quando o trazemos dentro de nós?”. Fiquem de olho em Guadalupe Nettel.
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