É raro o português que responde certo quando se pergunta quem foi o último rei de Portugal, mas todos sabem, na ponta da língua, que o Navegador que descobriu o Brasil foi Pedro Álvares Cabral. E Cabral há-de deter essa honra, oficialmente, para sempre. Porque assim decidiram os monarcas portugueses no final do século XV, num ambiente de intrigas e conspirações nas cortes europeias.
A grande competição que se seguiria pelas riquezas do Novo Mundo obrigava a secretismo e a muita cautela. Segundo os documentos em que Duarte Nuno Braga se baseou para escrever “A Confissão do Navegador” (Editorial Presença, 2016), a descoberta do Brasil foi tudo menos acidental. Foi uma grande empresa da realeza Portuguesa, no seguimento da descoberta dos arquipélagos, do desbravamento da costa Africana e da busca incessante pela rota marítima para a Índia.
O livro parece debruçar-se sobre dois momentos distintos em que Duarte Pacheco Pereira pôs a sua vida ao serviço do país: o primeiro determinaria as exigências de Portugal aquando das negociações para o Tratado de Tordesilhas (1494: o Mundo fica dividido em dois, cada metade a ser concedida aos Portugueses ou aos Espanhóis para exploração de novos territórios). O segundo solidifica o comércio entre o ocidente e o oriente, porque, como aliados do rajá de Cochim, houve necessidade de combater as pretensões dos mouros na Índia e de acabar com a sua sobranceria nessas paragens. De ambas as vezes, o autor narra as dificuldades, as estratégias, os receios de um homem que pôs a vida ao serviço do reino, e que com isso alcançou a glória e sofreu amargos desgostos e desconsiderações, em parte pelo absoluto sigilo em torno das suas missões.
O trabalho histórico está bem conseguido – sobretudo a nível de vocabulário, técnicas de navegação, conhecimentos marítimos, cartografia, etc. Surgem algumas pequenas falhas a limar por parte do autor em livros futuros (a menção a eucaliptos em Portugal no séc. XV, por exemplo, quando apenas chegaram ao nosso reino em 1860, aproximadamente).
Para uma estreia no romance, a narrativa é bem ritmada – um tanto apressada, por vezes, mas não é necessário enrolar. Os diálogos demonstram a formalidade da época, pelo que de início podem soar um pouco forçado mas depressa nos sintonizamos para as vozes dessa época.
Não é nenhuma epopeia que aqui se narra, mas sim uma missão secreta que o país, ainda hoje, ignora grosseiramente. Para este livro nos ficar entranhado, é necessário que da próxima vez que vos perguntarem quem descobriu o Brasil, respondam “Duarte Pacheco Pereira, em 1493”. É sempre pertinente um livro que chega e muda a nossa perspectiva do que nos era sólido, e é desafiante saber que a História de Portugal continua prenhe de eventos como este.
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