Deana Barroqueiro nasceu na América – filha de pais portugueses e com dupla nacionalidade –, chegando a Portugal com apenas dois anos de idade, país onde, após se licenciar em Filologia Românica pela Faculdade de Letras de Lisboa, se tornou professora no ensino secundário.
O seu imenso gosto pelo romance histórico começou a evidenciar-se a partir de 2000, publicando até hoje onze romances históricos e crónicas, entre os quais “D. Sebastião e o Vidente” (2006), ”O Navegador da Passagem – Bartolomeu Dias“ (2008), “O Espião de D. João II” (2009), “O Corsário dos Sete Mares” (2010) ou “Tentação da Serpente” (2012).
“1640” (Casa das Letras, 2017) é o seu mais recente romance histórico, cuja acção decorre entre 1617 e 1667, um período fecundíssimo de factos, acontecimentos dramáticos e individualidades, “num Portugal esgotado que tentava desesperadamente sobreviver como país independente, acossado por nações inimigas – a Espanha e as suas aliadas – , mas também pelas amigas de longa data, como a Inglaterra e a França, que impuseram condições esmagadoras em troca da sua ajuda” – como diz a autora na Carta ao leitor que escreve a abrir o livro.
Trata-se de uma narrativa sobre um marco fundamental da nossa História, sob domínio de Filipe IV (Terceiro de Portugal), o da Restauração da Independência, após seis décadas de dominação filipina castelhana, que viriam a culminar na instauração da 4ª Dinastia Portuguesa – a Casa de Bragança -, fruto da revolta dos portugueses que aclamavam D. João IV.
São quatro os guias singulares que vão conduzir o leitor nesta viagem ao passado, através de dramas pessoais e colectivos, que narram circunstâncias politicas, sociais – incluindo a situação e vida das mulheres de seiscentos versus a tirania masculina -, costumes entre povos, classes e etnias – alguns a todos os títulos bárbaros -, feitos militares, conspirações sanguinárias, espionagem, mortes e traições, missões diplomáticas nacionais e internacionais. E quatro figuras: o Poeta (proscrito) Brás Garcia Mascarenhas, autor da epopeia Viriato Trágico; a Professa (Soror) Violante do Céu, a Décima Musa da poesia barroca, enclausurada no convento dominicano da Rosa, em Lisboa; o Prosador (fidalgo) Dom Francisco Manuel de Melo, prisioneiro na Torre; e o Pregador (jesuíta) Padre António Vieira, o mais brilhante do seu tempo, a contas com a Inquisição. Figuras que a autora descreve desta forma na Carta ao leitor: “Quatro personalidades, que marcaram profundamente o seu tempo, dar-lhe-ão de sua própria voz quatro pontos de vista diferentes, mas complementares, sobre os acontecimentos em que tomaram parte, ao mesmo tempo que lhe irão fazendo confidências das suas vivências e dramas pessoais”.
Com quatro narradores de época e através de uma estrutura formal de verdadeira dialéctica utilizada no romance, Deana Barroqueiro aborda a complexidade daquele tempo – quer em Portugal quer em Espanha -, os jogos políticos nacionais e internacionais e a mentalidade dos agentes, com um interesse permanentemente renovado numa narrativa que se explana em 870 páginas.
A excelência desta obra sobre a crise social, económica e política, agudizada na década de 1630 com a actuação de Filipe IV e o conde-duque de Olivares, ancora num aturado e meticuloso estudo e numa profunda pesquisa – o romance esteve em maturação durante treze anos -, cruzando uma infinidade de matérias sociopolíticas e humanas de época, de cambiantes múltiplas e complexas, evidenciando um multifacetado e íntimo conhecimento sobre a Restauração da Independência Portuguesa, a par do perfeito domínio sobre a situação cultural e económica de então.
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