Irlandeses, americanos, judeus, pretos. Qualquer um deles não escapava à má e muito afiada língua do reverendo Charles Kingsley que, entre 1862 e 1863, escreveu para a Macmillan`s Magazine “Os Bebés da Água” (Tinta da China, 2015) – com o sub-título Contos de Fadas Para Um Bebé Terreno e ilustrações de W. Heath Robinson -, livro que se viria a tornar um caso sério de popularidade em Inglaterra até que, finalmente, foi arrumado na estante, provavelmente por disparar xenofobia em muitas direcções.
«Era uma vez um pequeno limpa-chaminés que se chamava Tom. É um nome curto e já antes o ouviste, por isso não será difícil lembrá-lo». Começa deste forma a história de Tom, um dos muitos trabalhadores infantis do legado da Revolução Industrial, que não saber ler, muito menos escrever e só toma banho quando o rei faz anos.
Juntamente com Grimes, o seu temível Patrão, vai até casa do riquíssimo Sir Soho Harthovel, mas um erro de cálculo e uma fuga milimétrica à morte vai levá-lo até Kendale, um lugar mágico onde se afoga nas águas de um ribeiro para, graças à intervenção de fadas, renascer como um bebé de água. É então que embarca numa série de aventuras, que têm por trás uma educação cristã que visa a redenção, não sem antes ser perseguido como um miserável ladrão. Há também Ellie, uma rapariga que está muito bem na vida mas que, à semelhança de Tom, será transformada num bebé de água, nascendo entre os dois uma química considerável.
Bem ao estilo dos romances de época vitorianos, “Os Bebés da Água” é uma fábula moralista que se propõe atingir – e oferecer – fins didácticos, onde Kingsley se entretém a falar daquilo que considera prejudicial ao seu tempo e saindo em defesa da teoria de evolução darwinista, ao defender que nenhuma pessoa está qualificada para dizer algo sobre o que nunca terá visto – tal como a alma humana ou, se quiserem, um bebé da água.
A século e meio de distância, podemos agora olhar descomprometidamente para este livro de Kingsley como um compêndio de lições de moral e paralelismos religiosos, que dificilmente despertará grande interesse nos mais petizes. “Alice no País das Maravilhas”, por exemplo, será um festim psicotrópico de maior agrado.
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