Se fizermos o exercício de escolher 20 livros do universo da literatura infantil que tenham atravessado a história para ganhar o estatuto da intemporalidade, um deles será certamente “O Vento nos Salgueiros” (Tinta da China, 2015 – colecção de Clássicos Ilustrados em formato de bolso e cantos redondos), do escocês Kenneth Grahame.
Escrito em 1908, esta espécie de alegoria foi-se construindo sob a forma de cartas de Kenneth para o seu filho. Cartas que, depois de reunidas, fizeram a fortuna de Grahame, permitindo que este se aposentasse tranquilamente do monótono emprego de secretário do Banco da Inglaterra. Se não foi um dos primeiros escritores a conseguir viver da escrita, Kenneth Grahame terá, certamente, andado lá muito perto.
Sempre com um rio serpenteante e todo o bucolismo dado aos ingleses a atravessar o livro, “O Vento nos Salgueiros” tem como personagem central uma Toupeira, “animal volúvel por natureza e sempre dominado pela sua imaginação“, com o ar de ter passado toda a vida metida na sua toca e que, de repente e graças ao surgimento do Rato d’Água, se deixará levar pelo encanto e rebuliço de uma vida feita de passeios de barco, caminhos perigosos e amizades à prova de bala.
Para além da Toupeira e do Rato, o livro reúne uma galeria fantástica de personagens: o Sapo, decididamente um bom tipo “mas sem estabilidade“, que vive de obsessão em obsessão de forma apaixonada mas pouco duradoura, seja esta feita de barcos, caravanas ou automóveis. Um tipo, de acordo com o sempre racional e devaneante Rato, “simples, bondoso, afeiçoado mas pouco inteligente, gabarolas e presunçoso“; ou a Lontra, animal numa busca constante pelo permanente e inatingível sossego.
Ao longo do livro, há coisas tão fantásticas como as regras – nunca apresentadas como tal – da etiqueta animal, onde se inclui não insistir em falar de possíveis problemas futuros, não fazer comentários a respeito do súbito desaparecimento de um amigo ou, ainda, não se exigir a qualquer animal que faça algo tenaz, heróico ou tão-só moderadamente activo durante a época de descanso invernal.
História de amizade e mudança, de lendas e mitos, “O Vento nos Salgueiros” é uma alegoria sobre a vida humana vestida com peles de animais, num mundo feito de contrastes sociais e de personagens que, ainda que muito diferentes na sua essência e hábitos, arranjam forma de subsistir lado a lado em perfeita harmonia. Um daqueles livros para crianças que todos os adultos deveriam ser obrigados a ler.
1 Commentário
[…] O Vento nos Salgueiros – Kenneth Grahame – Deus me Livro – um clássido da literatura juvenil, “história de amizade e mudança, de lendas e […]
https://acrisalves.wordpress.com/2016/03/01/fevereiro-de-2016/