Considerado um dos grandes génios da Literatura Portuguesa, Camilo Castelo Branco consagrou-se, no mundo da literatura, com o romance ‘’Onde está a felicidade?”. Com uma grande personalidade crítica da sociedade da altura, as suas obras nascem desta sua característica, algo que não foi diferente com a narrativa que se desenrola em “O Que Fazem Mulheres” (Guerra & Paz, 2016).
Graficamente, o livro apresenta-se misterioso e sedutor: há mesmo um capítulo avulso (para ser lido na altura que o leitor assim o desejar) e um capítulo fechado de cinco páginas que, nas palavras do próprio Camilo, ‘’… é melhor nem lerem’’.
Quanto ao conteúdo, a organização é díspar. O autor apresenta dois prólogos – ‘’ A todos os que lerem’’ e ‘’A alguns dos que lerem’’ – e, também, um epílogo. Camilo vai tratando de avisar desde logo o leitor: ‘’É uma história que faz arrepiar os cabelos. Há aqui bacamartes e pistolas, lágrimas e sangue, gemidos e berros, anjos e demónios. Isto sim é que um romance’’. E que romance.
‘’É uma história que faz arrepiar os cabelos’’, não só pelo romance mas por todo o amor puro – o de família – que aqui é relatado. Ao contrário dos contos habituais, o autor vai narrando esta história como se estivesse a relatar um acontecimento real, juntando esporadicamente uns comentários pessoais.
Ludovina, personagem principal, uma prendada moça, angelical e descrita de modo a ser igualada à perfeição, está apaixonada por um D. Juan de seu nome Ricardo de Sá, cujas intenções são rapidamente desmascaradas por D. Angélica, senhora mãe de D. Ludovina e prometida por seu pai, Melchior Pimenta, a João José Dias, um homem que fez fortuna no Brasil e que é narrado, pelo autor, como sendo um sujeito gordo e profundamente feio.
‘’Olha, filha, se te não fosse penosa a experiência, deixava-te casar por paixão’’, ouve D. Ludovina de sua mãe com o coração despedaçado, aceitando a sua sina para se casar com João José Dias. Mudam-se assim para o Porto, levando consigo D. Angélica e Melchior Pimenta.
Depois de se encontrarem com Ricardo de Sá numa festa, João José Dias revela ser um indivíduo muito ciumento e desconfiado, afastando a esposa das festas e da sociedade, mas depressa D. Ludovina se apercebe desta atitude e admite que o seu marido está demente. É impossível continuar a escrever sem revelar um pouco mais dos acontecimentos, por isso apenas se pode adiantar que, a partir daqui, a história se vai desenrolar entre o adultério e alguns tiroteios. Surpreendente será também a reviravolta que a história oferece, bem como a forma que família descobre de se proteger mutuamente dos maldizeres da sociedade.
Conto agradável de se ler e de escrita densa, “O que fazem mulheres” alia uma pitada de humor à já habitual crítica à sociedade da altura, servindo de verdadeira homenagem às mulheres e ao amor incondicional entre mãe e filha.
’’… a mulher é um ser exuberante de sensibilidade e apoucado de raciocínio. (…) Privam-nas da razão para as excluírem das funções que as requerem; sentenciam‐nas pela razão, se o sentimento, seu dom essencial, as desvia do piso demarcado por elas.‘’
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A citação final, descontextualizada da maneira que ficou, pode ser mal interpretada