Remembrança. Se este livro tivesse de ser resumido a uma palavra esta seria a escolhida, amplamente repetida ao longo de toda a obra. Ler “O Quarto Trancado Onde Nem a Morte Entrava” (Abysmo, 2015) é, acima de tudo, entrar no mais íntimo do autor e num tema transversal que lhe é bem sensível: a morte.
Ao longo de sete contos, uns mais reflexivos, outros mais leves, em que através de simples conversas de café se revisitam reminiscências da infância, vamos desfiando as memórias de Ricardo Ben-Oliel. Recordamos momentos marcantes da sua vida, por vezes duros fragmentos de memória que ainda hoje o fazem acordar sobressaltado à noite. São contos com histórias peculiares, próprios de quem tem um trajecto de vida também ele peculiar. A par de assuntos pesados, como a morte de judeus na Polónia, a emigração e outros complicados reveses da vida, somos também brindados com um conto num tom mais cómico – “Um delinquente com escrúpulos” –, mas que ainda assim nos faz reflectir.
Viajamos entre Israel e Lisboa, conhecendo diferentes tradições, ritos, costumes e superstições – não estivéssemos nós a falar de um autor emigrado em Israel por motivações ideológicas. Num estilo muito próprio, que ressalta logo no primeiro conto, Ben-Oliel envolve-nos no intrigante tema da morte: “qual o enigma por detrás daquela insondável, provocante quietude, tão próxima e tão remota, qual a razão para logo tudo se silenciar?”.
São as sucessivas remembranças partilhadas com o leitor que o fazem “mergulhar num impenetrável aturdimento”. Percebemos como a vivência da morte, qual ferro quente, fica para sempre marcada na pele. Aliás, chegados ao final do livro, temos a percepção de que é o próprio autor que, tal como aludido no título, se quer trancar num quarto tão bem fechado onde nem sequer a morte ouse entrar. Resta, neste emaranhado de pensamentos e recordações, encontrar a chave que permita “erguer uma inexpugnável fortaleza”.
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