Publicado originalmente em 1983, “Música para Água Ardente” (Antígona, 2015) oferece-nos trinta e seis contos, todos eles curtos, do mais puro e incomensurável Charles Bukowski. Não há aqui lugar a cocktails ou a licores adocicados: há que preparar o cérebro para uma ressaca de vidas frustradas, viagens perdidas e imagens violentas.
Quando lemos Bukowski ficamos invariavelmente com a sensação de que ninguém é normal pelos parâmetros comuns, que existe sempre alguma perversão secreta ou acto escondido que transforma qualquer um numa personagem literária mais ou menos interessante. A obra de Bukowski assenta muito nesse estereótipo, indivíduos sem grande passado e futuro incerto, a representação do anti-herói.
A sua imagem de alcoólico e poeta maldito é forjada nas experiências sórdidas por que foi passando ao longo da vida. Desde empregado de limpeza a carteiro, C.B. fez de tudo para sobreviver até alcançar o reconhecimento por aquilo que escrevia. O infame alter-ego Henry Chinaski, presente nos seus vários romances, surge também em alguns dos contos de «Música para Água Ardente» ao lado de outras figuras sórdidas, habituais no universo do autor.
A nudez crua, o desespero, a solidão e a ironia que caracterizam Bukowski e fazem dele um escritor diferente de todos os outros, são constantes ao longo dos contos reunidos neste livro, assim como a fatalidade da existência, a humanidade nos seus traços mais invisíveis mas, também, mais imperfeitamente constantes, captada e pronta a “digerir” com a ajuda e companhia duma «água ardente», destilada numa sarjeta suja.
Obscuro, parasita, alucinado, são vários os adjectivos possíveis de utilizar para descrever Bukowski mas, o mais correcto, será utilizar sempre «genial».
«Qual é o seu conselho para os escritores jovens?
-Bebam, fodam e fumem muitos cigarros.
Qual é o seu conselho para os escritores mais velhos?
-Se ainda estão vivos, não precisam do meu conselho.»
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