Os conflitos são habitualmente segmentados ou compreendidos através de períodos temporais de forma a conseguir-se um perfil cronológico. Se a Segunda Grande Guerra ficou definida por uma baliza entre 1939 e 1945, o primeiro grande embate de perfil mundial encaixa, por norma, num período de quatro anos, isto é, entre 1914 e 1918.
Mas, por vezes, essa matemática cronológica está sujeita a readaptações que derivam de novos estudos e análises globais. E é mediante tais pressupostos que “Impérios em Guerra 1911-1923” (D. Quixote, 2014) foi pensado, escrito, organizado e apresentado por Robert Gerwarth e Erez Manela em conjunto com mais de uma dezena de alguns dos maiores especialistas mundiais no que ao período da Primeira Grande Guerra diz respeito.
Falamos de uma obra que apresenta uma nova perspetiva da Primeira Grande Guerra que extravasa a genericamente aceite linha cronológica entre 1914 e 1918, olhando para o conflito como um recontro global entre impérios e recusando uma abordagem unicamente observada entre nações ou estados europeus.
Ao folhear “Impérios em Guerra 1911-1923”, somos convidados a entender um conflito que apresenta dados concretos em termos de tempo e espaço e que abarca violentos acontecimentos que antecedem e precedem a Primeira Grande Guerra, como o foram a invasão italiana à Líbia em 1911 ou os ecos violentos que resultaram do colapso dos impérios otomano, russo e austríaco até 1923.
Apenas poderemos entender o que se passou entre 1914 e 1918 tendo em conta os desequilíbrios que tiveram como palco a Europa – e não só – e que transcendem as desmobilizações militares levadas a cabo em novembro de 1918. A esses quatro anos devem “juntar-se” os embates imperiais entre 1911 e 1923.
Quando ainda se sentem os ecos do primeiro centenário da Primeira Grande Guerra, é urgente adotar uma perspetiva diferente face aos milhões que perderam a vida, aos interesses conjunturais e respetivos atos governativos, aos locais por onde o conflito passou e que ultrapassaram as fronteiras do Velho Continente.
Mas “Impérios em Guerra 1911-1923” vai mais longe e leva o leitor a compreender as movimentações globais de tropas africanas e dos civis chineses nas trincheiras na frente Oeste, os trabalhos dos soldados indianos em Jerusalém ou as movimentações nipónicas em terras chinesas que, diretamente ou não, foram responsáveis pela nova ordem mundial.
Olhando um pouco para o umbigo, não podíamos deixar de destacar o capítulo dedicado ao Império Português, cuja autoria esteve a cargo de Filipe Ribeiro de Meneses, professor de História na National University of Irland Maynooth. Nestas três dezenas de páginas ficamos a conhecer melhor a conjuntura do Portugal da década de 1910, bem como a atividade militar das tropas nacionais em Angola e Moçambique, assim como questões relacionadas com o rescaldo do conflito.
Resultado de um notável espírito de pesquisa, “Impérios em Guerra 1911-1923” nasceu depois de anos de trabalho – a maioria dos autores reuniu-se por duas vezes em conferências temáticas que tiveram Dublin como palco -, complementando o seu conteúdo através de mapas e imagens que tornam ainda mais dinâmico e apelativo um livro que tem o condão de revelar outras faces de um conflito que representou uma das maiores mexidas no mapa global do planeta.
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