Oriundo dos Açores, “a região mais distante do centro da Europa”, Eduardo Paz Ferreira é professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, bem como subscritor do Manifesto dos 74, o tal que apelava a uma alternativa à austeridade e à reestruturação da dívida, numa altura em que as legislativas de 2015 não preocupavam muito à coligação PSD/CDS. Se o futuro é a reeleição, só deus sabe.
O “europeísta convicto” apresenta-nos Da Europa de Schuman à não Europa de Merkel” (Quetzal, 2014), simultaneamente um contextualizador histórico sucinto e eficaz na exposição de uma agenda anti-austeridade sustentada pelas teses de Paul Krugman e Thomas Piketty, entre outros.
Pese os acontecimentos sócio-económico-político-tudo que afectaram, para o bem ou (maioritariamente) o mal, a população global, trata-se aqui especificamente do cidadão europeu e da forma como este se revê além da identificação nacionalista do seu país – como integrante de uma comunidade de grandes aspirações, uma Europa a competir pelo estatuto de super-potência de referência, à sombra do seu passado mas varrendo para debaixo do tapete qualquer elefante na sala. Esta agregação, ao mesmo tempo que dá margem para um ou outro colosso financeiro-industrial-tecnológico-cultural-tudo fortalecer o seu impacto global, facilita também o domínio sobre os países mais necessitados de reformas estruturais, que aderiram ao sonho da moeda única com a esperança de uma maior uniformização de riqueza no território da UE.
Quanto à problemática posta pela obra, numa ponta do friso cronológico, temos a cada vez mais utópica visão de Robert Schuman, ministro dos Negócios Estrangeiros francês entre 1948 e 1952, responsável pelo Plano Schuman (em colaboração com Jean Monnet), considerado o início daquilo que viria a tornar-se a União Europeia. Na ponta oposta do dito friso – o presente – temos Angela Merkel, evocativa, de forma pejorativa no imaginário popular dos países que lhe prestam vassalagem, anacronismos à parte, do passado infeliz alemão. Sendo o país mais influente da UE, rapidamente pôs o passado sombrio atrás de si, tornando-se novamente na referência europeia por excelência.
A Alemanha que governa a chanceler possui um superavit recordista, sendo que a sua administração assume o papel de pai severo dos filhos rebeldes da União, leia-se, deficitários. O resultado, como bem sabem os portugueses, é uma sobeja perda de soberania para os países que foram resgatados de um fosso financeiro, retirando-lhes “qualquer margem para desenvolvimento de políticas económicas autónomas e, sobretudo, políticas sociais que deveriam ser da” responsabilidade dos mesmos. Os PIGS (curiosa ordem atribuída aos países do sul, leia-se Portugal, Itália, Grécia e Espanha), talvez calos nos pés da Europa, veriam por exemplo, uns mais que outros, a sua autonomia governativa severamente abalada ou no mínimo condicionada às vontades das nações com maior influência na UE.
Eduardo Paz Ferreira terminou Da Europa de Schuman à não Europa de Merkel em Maio de 2014. Ainda estava para acontecer a vitória do Syriza e respectiva cobertura micro-viral de José Rodrigues dos Santos. Também não se sabia que António Costa ia derrotar Seguro por larga maioria nas primárias do Partido Socialista. Mas aquilo para o qual não é preciso ser bruxo é que, como diz o título do artigo do Público em jeito da mais pura constatação do óbvio, “A Grécia não é Portugal e o PS não é o Syriza”. Sendo que dificilmente a maioria dos portugueses optará por sair do eixo centro-esquerda e centro-direita a que se acostumaram, é também de um irrealismo tamanho esperar que António Costa tenha um discurso de rotura como pedem os partidos de esquerda. Considere-se as eleições gregas irrepetíveis fora do seu contexto: chegar-nos-á alguma mudança? Ou, haverá para os gregos mudança tal que o poderio alemão não deite por terra? Existem mais preocupações e prenúncios que respostas.
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