Há um velho ditado que tem tanto de idiota como de certeiro: quem brinca com o fogo queima-se. No caso de Bill Browder, fundador e CEO da Hermitage, pode dizer-se que a brincadeira foi tanta que o incêndio que deflagrou na Rússia podia ser visto da América num dia de nevoeiro intenso.
Browder foi o maior investidor estrangeiro na Rússia até ao ano de 2005, altura em que foi proibido de entrar no país. Se tivermos em conta que no poleiro político estava Putin e uma obscura ditadura e que Browder andou durante anos a comprar empresas – através de privatizações – e acções russas como quem joga ao monopólio, seria uma questão de tempo até que alguém se chateasse por nunca conseguir acertar no estacionamento livre.
“Alerta Vermelho” (Vogais, 2015), livro escrito na primeira pessoa, é uma semi-biografia de Bower: neto do líder do Partido Comunista americano e filho de dois quase génios da matemática, alguém que trocou a utopia e o lado esquerdo do ADN pelo doce e aventuroso sabor do capitalismo, tendo descoberto, antes de toda a gente, que as privatizações do leste europeu eram uma forma de ganhar dinheiro. Muito dinheiro.
O livro lê-se quase como um thriller, dando a conhecer a vida de Browden mas, sobretudo, o modo de funcionamento do governo russo – e dos muitos oligarcas: percorremos o percurso familiar de Browder, com tónica na ascensão desviante antes do reconhecimento; acompanhamos a sua aventura estudantil, das borgas tremendas à epifania de ver no 20 o único número; seguimo-lo na aventura polaca, na sua visão pessoal de que o investimento no leste seria o futuro de quem queria enriquecer; temos também um vislumbre da sua vida amorosa, do casamento ao divórcio e ao nascimento de uma nova paixão.
O grande momento do livro prende-se com a exposição do caso de Sergei Magnitsky, o advogado de Browder que, em 2009, foi isolado numa cela de uma prisão em Moscovo, tendo sido algemado e espancado até à morte por agentes policiais; isto por ter testemunhado contra funcionários do Ministério da Administração Interna da Rússia envolvidos no roubo de 230 milhões de dólares pagos em impostos pela Hermitage.
Desde então Browder empenhou-se em denunciar a corrupção e o abuso dos direitos humanos na Rússia, conseguindo um pequeno-grande triunfo em 2012 quando, nos Estados Unidos, foi aprovada a Sergei Magnitsky Rule os Law Accountability Act, uma lei que impõe interdições de vistos e congelamento de activos a funcionários públicos envolvidos na morte de Magnitsky. Uma lei que Browder quer agora ver aprovada na União Europeia.
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