Nascido em Berlim no ano de 1959, Sascha Arango é apontado como um dos mais reputados argumentistas e dramaturgos alemães, distinguido com vários prémios entre os quais se encontra o Grimme Preis, que recebeu em dose dupla.
“A Verdade e Outras Mentiras” (Editorial Presença, 2015) é a sua primeira aventura no mundo do romance, um thriller a tocar a comédia negra, feito de jogadas mal calculadas e com um início a prometer, desde logo, alguns sobressaltos e pinceladas psicóticas: «Pouca sorte. Uma breve olhadela à imagem chegava para dar forma ao vago pressentimento dos últimos meses. O embrião estava curvado como um batráquio, com um olho a fitá-lo directamente. Aquilo ali era uma perna ou um tentáculo por cima da cauda de dragão?»
O livro tem como protagonista Henry Hayden, um escritor de sucesso com um passado cheio de segredos que, com o seu charme e uma atitude sedutora, tem sabido cativar fãs – e sobretudo, admiradoras. “Frank Ellis”, o seu primeiro romance, contava a história de um autista que se tornava polícia para encontrar o assassino da irmã.
Oito anos depois, com mais dinheiro do que aquele que consegue gastar e uma fama maior do que aquela que mereceria, Hayden vê a sua vida de fachada ameaçada de ruir quando Betty, a amante de longa data e leitora-chefe na editora Moreany, lhe revela que está grávida.
Ameaçado por duas espadas, Henry comete um erro fatal na tentativa de manter a vida sem revoluções ou sobressaltos, lançando-o numa espiral de mentiras e enganos para a qual dificilmente encontrará escapatória.
Em paralelo conta-se a história de Gisbert Fasch – ou Travis Forster -, que com Henry – ou por causa deste – viveu tempos de pesadelo no Orfanato de Santa Renata. Um escritor falhado, praticamente falido depois de uma fracassada edição de autor, que enviou os (muitos) exemplares não vendidos para reciclagem em materiais de isolamento.
Mas há, no livro, outras personagens marcantes. Como Martha, mulher de Henry, sinestésica de nascença: cada aroma, cada ruído, fá-la ver cores e padrões; ou Obradin, o vendedor de peixe da aldeia, que gosta de armas e sofre de dupla personalidade.
Thriller psicológico à volta da ideia da (im)possibilidade de cometer o crime perfeito – aqui nascido da imperfeição -, “A Verdade e Outras Mentiras” é, também, um retrato irónico do acto de escrita, que, se para uns obedece a um carácter de urgência, mais físico do que material, para outros está umbilicalmente ligado à fama. Uma boa estreia, mesmo que a segunda metade do livro não acompanhe o ritmo frenético da primeira.
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