Costuma dizer-se que há quatro vezes mais probabilidades de se ser atingido por um raio do que ganhar a lotaria ou o Euromilhões, mas quais serão as probalidades de se acertar em todos os números para, logo a seguir, se dar conta de que o bilhete mágico já era? Foi precisamente isto que aconteceu a três amigos romenos que, depois de um deles ter posto em risco uma pequena fortuna deixando que um par de larápios lhe levasse a pouco abonatória bolsa de cintura, se lançam numa estranha demanda, que envolve invasão de propriedade alheia, ameaças com armas de fogo e outras aventuras dignas de um filme de gansters de pacotilha.
É esta a trama montada em “Two Lottery Tickets” – “Doua Iozuri” no original -, uma comédia escrita e realizada por Paul Negoescu, cuja película parece ter sido impressa a partir de uma velha polaroid, resultando numa imagem esbatida que assenta muito bem a este filme on the road de olhos postos na fortuna.
Dinel Petre (Dorian Boguta) é um mecânico de uma pequena cidade, não muito longe de Bucareste, que sonha com juntar um pé-de-meia que lhe permita trazer de volta a sua mulher de Itália, que parece estar a ficar demasiado confortável por lá e a cair nas boas graças do tipo para o qual trabalha. Dinel vai carpindo as mágoas num bar local, onde se encontra com uma regularidade suíça com os amigos Vasile (dragos Bucur) – ou Sile -, um adepto confesso das apostas, e Pompilu (Alexandru Papadol), o mais moderado deste trio, que parece funcionar como o lado luminoso desta animada consciência colectiva. É neste bar que, num final de tarde e depois de um cocktail feito de álcool, lamúrias e crença, decidem comprar um bilhete de lotaria – mais parecido com o Euromilhões -, com os números escolhidos a dedo por Dinal que, de tão próximos, parecem reduzir ainda mais as hipóteses ganhadoras. Mas a verdade é que a sorte lá acaba por lhes bater à porta, mas o roubo inconsciente do bilhete mágico desperta neste trio amedrontado instintos escondidos que os levará, numa odisseia a motor, a enfrentar dealers armados, prostitutas com boa conversa ou videntes diplomadas na trafulhice.
Paul Negoescu apresenta, valendo-se da química deste trio, uma comédia sempre a direito que não deixa de tocar, mesmo que ao de leve, outros temas mais sérios ou filosóficos como a corrupção, a sorte, a miséria ou a felicidade. E tudo à boleia de uma banda sonora feita de dedilhados, que lembra o deserto americano em dia de jornada psicotrópica.
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