João Nicolau e Miguel Gomes podiam muito bem ser as duas faces da mesma moeda, com o seu cinema absurdo e surrealista. Houve uma altura que a carreira de ambos esteve lado a lado, com prémios internacionais e nacionais (“Rapace”, lembram-se? Ou “A cara que mereces”?) mas, depois, só Gomes conseguiu consolidar o seu crescimento e reconhecimento enquanto cineasta. O que não implica que Nicolau tenha desaparecido do mapa.
Depois de “A espada e a rosa”, eis a segunda longa-metragem do cineasta português: um teen movie cheio de angústia juvenil niilista e altamente consciente do seu tempo e lugar. “John From” (O Som e a Fúria, Shelac Sud, 2015) é o “Ghost world” da juventude portuguesa – duas adolescentes (excelentes estreias de Júlia Palha e Clara Riedenstein) a viverem as férias de verão, período em que tudo acontece com dramático exagero, para o bem e para o mal, na suburbia lisboeta. Uma história de aparente normalidade, com tanto de tédio quanto de teenage angst.
A rotina das férias é quebrada pela chegada do vizinho de Júlia Palha, FilipeVargas, depois de ter ido fotografar as ilhas da Micronésia (de onde vem, aliás, o título “John From” e cuja explicação dava, por si só, um filme isolado) -, por quem vai desenvolver uma paixão platónica. E, de repente, o filme é contaminado pelo onirismo (leia-se pelo mundo dos sonhos adolescente, em que tudo é possível), como acontecia em “A cara que mereces”, de Miguel Gomes, que a meio também era invadido pelo surrealismo.
O cinema de João Nicolau tem um lugar muito importante para algumas coisas bem específicas: a música (excelente banda-sonora de João lobo), a cultura popular e a palavra. Em “John From”, apenas esta última não tem particular destaque. Lembramo-nos, por isso, de Wes Anderson e de um certo formalismo meio cinéfilo meio nostálgico. “John From” é, portanto, o menos inventivo do cinema particular de Nicolau. O que não quer dizer que seja propriamente menos bom.
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