Existem encontros que parecem ser gizados no céu. O documentário “Gimme Danger” celebra um desses encontros: o do realizador Jim Jarmusch com Iggy Pop e os seus The Stooges (vénias encarpadas com saída à rectaguarda). Não é que seja uma grande surpresa. Afinal de contas, é sabido que o mais europeu dos cineastas norte-americanos e que o frontman dos Stooges são bons amigos há uns anos e até já vimos Iggy a representar num dos seus filmes (olá “Café e Cigarros”). No entanto, um documentário sobre os The Stooges realizado por Jim Jarmusch seria sempre um motivo a celebrar, independentemente das amizades ou outras relações afectivas.
“Gimme Danger” demorou 7 anos a ser feito e, ironia do destino, estreia quando já só Iggy Pop está cá para o ver (e contra todas as probabilidades, diga-se). É um documentário que celebra a carreira da banda, uma das mais importantes do mundo do rock, mas que, em 1974 quando se separou, era apenas um bando de drogados erráticos e muito barulhentos. Na conversa com Jarmusch que se seguiu à exibição do filme, no Leffest, o realizador explicou que a sua intenção era fazer apenas um documentário sobre a banda e, por isso, dispensou qualquer participação de fãs, críticos ou entendidos musicais, não querendo incluir discursos lambe-cus ou condescendentes. O que significa que “Gimme Danger” é feito apenas com a participação dos membros da banda e alguns participantes indirectos dessa carreira meteórica entre 67 e 74 – e que voltaria a ter novo fôlego a partir da reunião, em 2003.
Jim Jarmusch também explicou que não gosta dos documentários que parece que só se preocupam em revelar pormenores sórdidos sobre a vida dos seus retratados, tendo optado por fazer um filme sobre as coisas boas que os Stooges trouxeram ao mundo (e que foram muitas, diga-se). No entanto, essa parte já soa um pouco a desculpa. É que não era preciso andar a chafurdar na vida pessoal de Iggy e dos seus colegas para se falar do lado menos bom da carreira dos Stooges. É que, exceptuando um outro episódio curioso (como a história de como Ron Asheton telefonou a um dos estarolas originais, Moe Howard, para pedir permissão para usarem o nome Stooges), não há propriamente nada de novo para quem já conhece minimamente a história do grupo.
Não havendo muito material de arquivo disponível sobre os Stooges (“Gimme Danger”, mesmo assim, consegue compilar algumas fotos inéditas), Jim Jarmusch acaba por se divertir ao contornar esta questão com a utilização de excertos de filmes antigos, anúncios de televisão e outros clips aleatórios, que usa com grande humor, quase numa óptica de faça-você-mesmo, recuando aos tempos em que o realizador era um verdadeiro herói independente e fazia os filmes de uma forma muito artesanal e caseira. No fundo, o mesmo que fizeram os Stooges, punks muito à frente do seu tempo.
Gimme Danger vê-se portanto sem enfado, mas também não é um documentário revelador, que não vem descobrir a pólvora, sendo mais celebratório do que documental. Como resumiu um amigo meu, gosto muito mais dos Stooges e do Jarmusch do que deste filme. O que não quer dizer que o McChicken seja algo negativo.
*esta crítica é uma parceria entre o Royale With Cheese e o Deus me Livro
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