Falamos em comédia portuguesa e “Diamantino” sai logo a perder. Basta ir buscar duas das mais recentes comédias nacionais a estrearem nas nossas salas, “Tiro e Queda” e “Ladrões de Tuta e Meia”, olhar para um e para outros, e perceber automaticamente que não há comparação possível. E nem sequer estou a falar em ver os filmes, basta pura e simplesmente comparar os cartazes para perceber que não estamos a falar da mesma coisa. “Diamantino” tem um cartaz de cinema e “Ladrões de Tuta e Meia” tem um cartaz de alguém que deixou de se preocupar assim que o cheque bateu na conta bancária. Por isso, “Diamantino” não joga no mesmo campeonato. Que diacho, nem sequer é o mesmo desporto.
Feito o disclaimer, vamos lá então a “Diamantino”, a comédia que marca a estreia na longa-metragem de Gabriel Abrantes e Daniel Schmidt, as coqueluches da curta independente portuguesa. Este “Diamantino” não é o médio que foi um dos pilares do Benfica dos anos 80, mas também é jogador de futebol. E é o melhor do mundo, herói de um Portugal distópico mas não muito diferente do de hoje.
O Diamantino de Carloto Cotta é um reflexo de Cristiano Ronaldo e, apesar deste nunca ser nomeado, é impossível olhar para um e não ver o outro. São as parecenças físicas (e parecer que estão sempre de cuecas), as irmãs parasitas (as manas Moreira, ao nível da caricatura, são quase tão más que só lhes falta o uniforme nazi), o estatuto de símbolo da nação e até o sotaque…açoriano. E essa identificação é o primeiro grande trunfo do filme.
Diamantino é então um tipo super-ingénuo, cujo segredo do sucesso é imaginar cãezinhos peludos gigantes a correrem consigo no relvado. Na véspera da final do campeonato do Mundo, está Diamantino no seu iate quando dá de caras com um barco de refugiados, chocando de frente com a realidade. Com essa tomada de consciência da realidade, Diamantino deixa de ver os cãezinhos peludos gigantes e assiste ao princípio do fim da sua carreira. Em compensação, decide fazer o bem e adoptar um “refugiadozinho”.
Ao humor mais básico – mas que funciona sempre, como as personagens açorianas que têm sempre legendas -, Diamantino junta ainda um humor mordaz e inteligente, fazendo da sátira uma arma de arremesso que explode em várias direcções. Essa dispersão faz com que o filme se vá perdendo e, mais ou menos a meio, abraça o absurdo por completo, começando a perder interesse à medida que surgem em cena agentes secretos governamentais e nacionalistas fascizóides com planos malévolos de clonagem (!).
Tudo isto é ilustrado por Abrantes e Schmidt com o seu estilo quase niilista, de efeitos-especiais kitsch e brega. No entanto, ao contrário das suas curtas, onde isso nos deixa desligados da narrativa, em Diamantino tudo se cola à ingenuidade do protagonista, funcionando quase como mais uma faceta da sua personalidade. “Diamantino” podia ser um grande filme, mas é apenas um bom filme. Certo é que não se via algo tão louco desde “A Janela (Maryalva Mix)” do herói independente Edgar Pêra.
Artigo publicado originalmente em Royale With Cheese
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