Denis Villeneuve, o realizador canadiano que já tinha conquistado a crítica graças a “Sicário”, continua a assombrar: “O Primeiro Encontro” (“Arrival” no original) impressiona logo desde o início, já que a chegada de doze naves espaciais à Terra não podia ter sido filmada de forma mais enigmática. O cineasta, que não cai na armadilha do sensacionalismo, opta por mostrar os aparelhos estrategicamente posicionados – Estados Unidos, China, Rússia, entre outros – de um modo discreto, intensificando a curiosidade do espectador. Recebemos e acompanhamos a espantosa notícia da presença de alienígenas no nosso planeta através de Louise Banks (Amy Adams), uma professora de Linguística que interrompe uma aula sobre as origens da língua portuguesa para ouvir o relato dos acontecimentos em diferentes canais de televisão.
Precisamente por ser uma linguista conceituada, recebe a visita de um oficial do Exército (Forest Whitaker) solicitando a sua ajuda para estabelecer contacto com as misteriosas criaturas. Objectivo? Descortinar o motivo da visita. O facto de Whitaker falar muito baixo, quase sussurrando, torna tudo ainda mais nebuloso. E quando Louise ouve a gravação que contém sons produzidos pelos extra-terrestres, perguntando em seguida se eles têm boca, torna-se quase impossível não sentirmos um misto de terror e fascínio. Daqui até ser levada para o estado do Montana, onde uma das naves se situa, vai um pequeno passo.
Durante a viagem conhece Ian Connelly (Jeremy Renner), um físico teórico cuja missão também passa por estabelecer um modo de comunicação eficaz. De um lado, as letras; do outro, a ciência. Juntos, devem complementar-se para obter informações relevantes. E o mais relevante aqui acaba por ser a linguagem, a “arma” que os visitantes têm para nos oferecer. Uma arma tão poderosa que será capaz de reprogramar a forma como pensamos, alterando a natureza do tempo. É por esta razão que Louise se revela uma peça fundamental, visto tratar-se de uma comunicadora nata. Amy Adams veste primorosamente o papel para que foi eleita, tornando estimulantes os pormenores mais inexpressivos. E não deixa de ser curioso verificar que, num mundo de homens – militares, cientistas -, acaba por ser graças à intuição e à espontaneidade de uma mulher – já para não falar da sua coragem – que o contacto mais significativo com os alienígenas é estabelecido.
Em pano de fundo, acompanhamos uma tragédia na vida de Louise que ninguém conhece: a perda de uma filha, que morreu no início da idade adulta vítima de cancro. À medida que o contacto com os extra-terrestres se aprofunda, os flashes de memória sucedem-se, revelando uma história com contornos comoventes. A banda sonora harmoniza todo o processo, confirmando o talento de Jóhann Jóhannsson, que já foi nomeado para um Oscar pelo seu belíssimo trabalho em “Sicário”. Além disso, há que sublinhar o mérito do argumentista Eric Heisserer, que conseguiu a proeza de adaptar um conto de Ted Chiang (“Story of Your Life”) tido por muitos como “infilmável” – devido, em grande medida, ao carácter intrincado e à circularidade da narrativa.
O facto de “O Primeiro Encontro” ser um filme de ficção científica, um género que alguns consideram “menor”, encerra uma particularidade que será sempre interessante: por vezes, torna-se necessário o confronto com o que vem de fora para percebermos a essência da nossa própria humanidade. Estamos perante um hino ao poder da linguagem e a tudo o que nos une como há muito não se via.
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