Baseado na história real da própria autora, “Quando Hitler roubou o coelho cor-de-rosa” (Booksmile, 2015), publicado pela primeira vez em 1971, tornou-se um clássico da literatura juvenil ao oferecer aos jovens de todo o mundo uma introdução ao tema da Segunda Guerra Mundial.
Somos enviados para a Alemanha de 1933 através do pensamento de Anna, uma menina judia de 9 anos cujo pai, um famoso escritor alemão, se atreve a ser um assumido crítico do regime nazi. Anna, com a inocência própria da sua idade, está longe de perceber o ambiente político que a envolve, vivendo totalmente alheada dos cartazes “espalhados pela cidade de Berlim com a suástica nazi e a fotografia de Adolf Hitler”. Tudo muda quando o seu pai, antevendo a vitória do ditador nas eleições, se vê forçado a partir abrupta e secretamente em busca de um país de acolhimento. Cedo, Anna, a mãe e o irmão Max se juntam a ele na Suíça, a sua nova casa. Mas a aventura está apenas a começar, até porque a palavra “casa” assume um significado diferente quando se é refugiado.
Vamos acompanhando a nova vida da família, com todas as dificuldades próprias de quem se vê obrigado a um novo país, uma nova cultura, novas pessoas, uma nova língua, mas sempre demonstrando uma incrível capacidade de adaptação. Assistimos até a algumas situações caricatas, sobretudo devido às diferenças culturais, o que acaba por aligeirar um retrato que poderia ser muito mais duro. Ainda assim, Anna vai tendo conhecimento da situação de alguns judeus em campos de concentração, o que a deixa profundamente agoniada.
Se este livro adquire um tom mais soft, dado o tema pesado, deve-se ao olhar inocente de Anna, que se assume simultaneamente como o ponto forte do livro. Tão inocente que, quando lhe é dito que o pai tem “a cabeça a prémio”, ela pensa que lhe vai cair “uma chuva horrível de moedas pesadas” em cima. As ilustrações feitas pela própria autora, Judith Kerr, também tornam a leitura mais apelativa.
Muito mais do que uma história sobre a Segunda Guerra Mundial, esta é, acima de tudo, a história de uma família de refugiados. Aliás, o regresso deste livro há muito esgotado em Portugal, não poderia apanhar os leitores dotado de tanta actualidade. Como o faz lembrar – e muito bem – Carla Maia de Almeida no prefácio, estamos a braços com a maior vaga de refugiados desde o tempo da Segunda Guerra Mundial. É pois tempo de reflectir, e este livro é um excelente ponto de partida.
Uma história interessante, sobretudo se pensarmos no carácter semi-autobiográfico, que não se prende com detalhes históricos que poderiam aborrecer os mais jovens, mas sim no retrato do dia-a-dia de uma família com uma força surpreendente. Da Alemanha para a Suíça, França e, por fim, Inglaterra. Neste livro há muita coragem mas, sobretudo, muito afecto e uma mensagem importante: tudo está bem desde que a família esteja unida.
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