Jenette McCurdy foi, em tempos, uma das estrelas da série iCarly, da Nickellodeon, da sequela Sam & Cat e, também, da Netflixiana Between. Em 2017, decidiu reformar-se da carreira de actriz, passando para o lado de lá da câmera e dedicando-se também à escrita. Publicou ensaios, é dinamizadora do podcast Empty Inside – onde se fala de assuntos incómodos – e criou e protagonizou um espectáculo a solo, ao bom estilo da stand up comedy, intitulado “I´m Glad My Mom Died”, que veio a transformar-se também em livro, já publicado em Portugal: “Ainda Bem Que a Minha Mãe Morreu” (Lua de Papel, 2023).
“Estou na UCI com minha mãe moribunda e tenho a certeza de que a única coisa que a vai fazer acordar é o facto de que a única coisa que a vai fazer acordar é o facto de, desde que foi hospitalizada, o meu medo e tristeza se terem transformado no cocktail perfeito para uma anorexia e de eu ter, finalmente, atingido o peso que a Mãe estabeleceu para mim. Quarenta quilos. Estou tão certa de que este facto vai funcionar que me reclino na cadeira e cruzo as pernas pomposamente. Espero que ela recupere os sentidos. E espero. E continuo à espera.”
Nesta autobiografia, Jenette McCurdy arranja forma de, ao estilo de uma introspecção a céu aberto, expor toda a crueldade a que foi submetida, desde tenra idade, pela sua mãe numa relação com tudo de toxicidade. E fá-lo com muito humor, ironia, sarcasmo e algum espírito vingativo, ainda que pareça difícil romper as correntes com que foi amarrada desde muito cedo. “Ela precisava que não fôssemos nada sem ela”.
“A pequena actriz da mamã” começa na infância as suas audições, transformando-se “na artista do Cirque du Soleil do choro a pedido”, alimentada a red bull e a gatorade para se manter desperta, mesmo quando a febre estaciona e escala os 39 graus e meio. Ainda que o refira de forma ligeira, não foi nada fácil a vida para Jenette, com uma anorexia imposta, a descoberta da bulimia, relações tóxicas, falta de amor-próprio ou ter de viver com um sentimento de culpa a morder-lhe o estômago vazio, tendo no Espírito Santo o seu melhor amigo.
Catarse e introspecção, num exorcismo literário que confirma que o humor é mesmo um dos melhores anti-depressivos para uma vida lixada.
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