Quando falamos de ficção científica como género literário, há um nome que terá de constar de qualquer artigo, ensaio ou dissertação: o de Hubert George Wells (1866-1946), mais conhecido como H.G. Wells.
Se “O Homem Invisível” e “A Máquina do Tempo” se tornaram clássicos do género, foi com “A Guerra dos Mundos” (Sextante, 2019) que Wells atingiu o seu ponto mais alto, num livro que tanto serviu de base a adaptações cinéfilas como lançou o pânico através das ondas hertzianas (já lá iremos).
Escrito na primeira pessoa como um caderno de memórias, “A Guerra dos Mundos” mistura o relato histórico com uma dose generosa de terror, tendo Wells partido do fascínio por Marte e do desconhecimento que então tínhamos sobre este planeta que, ao longo dos anos, foi sendo associado a um possível lar de extraterrestres.
A narrativa tem início quando estranhos objectos, vindos do planeta Marte, vão caindo nos arredores de Londres – estamos em inícios do século XX. Tratam-se de cilindros, dos quais irão sair marcianos que, da letargia inicial, avançam para uma destruição implacável para a qual a nossa civilização mostra estar impreparada. Ao contrário das criaturas verdes, com cabeças consideráveis e tentáculos poderosos – um pouco como Tim Burton tão bem caracterizou em Mars Attacks -, os marcianos de Wells surgem dissimulados dentro de máquinas tecnológicas assassinas, dotadas de um poderoso raio incendiário e assentes em pernas metálicas que dão, no seu todo, a imagem de depósitos de água caminhando sobre tripés – a capa desta edição, que faz parte da colecção Biblioteca dos Tesouros, mostra bem todo esse imaginário.
O livro é-nos contado a dois tempos, sendo o primeiro centrado no irmão do narrador e, o segundo, no próprio narrador, que nos leva por uma viagem ao fim e ao recomeço da civilização que é, nas entrelinhas, um questionar da própria existência humana e o desafio – algo premonitório – para que o Homem se lance no espaço e encontre novos lugares onde possa sobreviver: “A ampliação das perspectivas do Homem daqui resultantes não podia ser mais gigantesca. Antes da queda do primeiro cilindro, havia uma percepção generalizada de que não existia vida no espaço à excepção da superfície da nossa minúscula esfera. Agora podemos ver mais longe. Se os marcianos conseguem chegar a Vénus, não há qualquer razão para supor que isso é impossível para o Homem, e que quando o lento arrefecimento do Sol tornar esta Terra inabitável, como acabará por acontecer, é possível que o fluxo de vida que aqui começou abandone este local e se lance ao nosso planeta irmão para o capturar. Deveremos conquistá-lo?”.
A 30 de Outubro de 1938, a CBS interrompeu a sua programação para noticiar uma invasão alienígena. Aquilo que não era mais do que uma dramatização de “A Guerra dos Mundos”, encenada pelo então jovem Orson Wells, levou a um pânico generalizado. Estima-se que pelo menos 1.2 milhões de pessoas tenham acreditado que se tratava de uma notícia real, o que acabou por levar ao entupimento das linhas telefónicas, a aglomerações nas ruas e congestionamentos e a um caos que conseguiu paralisar três cidades. Um acontecimento que evidencia bem o Mulder que há em nós, e que em surdina nos faz pensar: I Believe.
“A Guerra dos Mundos” é o sexto número da colecção Biblioteca dos Tesouros, com edição em capa dura pela Sextante, e conta com ilustrações de Henrique Alvim Corrêa. A tradução é de João Bernardo Paiva Boleo a partir do inglês.
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