Qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência. Pandemia, confinamento, máscaras, desinfecção, recolher obrigatório. Termos que hoje fazem parte do nosso dia-a-dia mas que, há 15 anos, pareceram tão descabidos às editoras que nenhuma aceitou publicar o livro de Peter May sobre uma pandemia que colocou o mundo em quarentena.
“Lockdown – Inimigo Invisível” (Marcador, 2020) acompanha a história de um detective, que se depara com um caso intrigante em pleno estado de emergência, no epicentro de uma pandemia provocada por um vírus mortal que assola Inglaterra.
Com uma taxa de infecção e de mortalidade aterradoras, esta estirpe do vírus da gripe concretizou aquele que seria o mais temível e distópico cenário: a destruição da realidade como se conhece. Militares na rua, motins, lojas vedadas, população confinada. Medo nas palavras e nas acções. A liquidação do homem como ser social. Assenta aqui a narrativa deste policial embora, a vários níveis, fique sempre a sensação de que o autor podia ter arriscado mais e rompido barreiras.
A verdade é que May não quis dar demasiada importância à pandemia: ela surge como cenário, quiçá como uma personagem secundária. Está sempre presente e condiciona a movimentação das personagens mas, se no início é determinante para desencadear a acção, a partir de certa altura acaba por se tornar invisível. Acompanhamos, portanto, o desvendar de um crime cometido contra uma criança, numa investigação rápida que se resolve com meia dúzia de passos e alguns lugares-comuns no caminho. Sem grande entusiasmo e com um grande facilitismo, tanto o protagonismo como o leitor vão investigando este mistério até conseguirem, juntos, criar o puzzle final. O que teria sido interessante explorar, em paralelo, seria precisamente o impacto desta crise de saúde pública no seio das autoridades, na exploração da vida clandestina e na saúde mental dos londrinos.
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