Em Setembro de 2018, Dean Nicholson, com 30 anos completados há pouco tempo, partiu de Dunbar, a sua cidade natal na costa leste da Escócia, decidido a percorrer o mundo de bicicleta. Pretendia, assim, libertar-se da rotina que lhe dominava a vida e realizar algo que valesse a pena. Três meses depois sentia que a viagem não estava a correr da melhor maneira, e o amigo com quem a iniciara já regressara a casa. É então que, numa região montanhosa da Bósnia, a quilómetros da civilização, ouve miados e repara que uma gatinha escanzelada corre desenfreadamente pela estrada, tentando acompanhá-lo. Incapaz de abandoná-la à sua sorte, num local onde morreria de frio ou de fome, decide levá-la consigo. A divulgação do vídeo deste encontro no Instagram foi um momento decisivo nas vidas de ambos e conduziu ao livro “A Viagem de Nala” (Ideias de Ler, 2020), desenvolvido em colaboração com o escritor Garry Jenkins.
Depois de recuperada, a gatinha a quem Dean chama Nala revela-se brincalhona, enérgica e meiga. Os laços entre os dois estreitam-se, ao ponto de criarem os seus próprios códigos de comunicação. Retribuindo os cuidados de Dean, Nala torna-se um “anjinho da guarda peludo” quando o seu humano fica doente ou em perigo. Em toda a parte atrai admiradores, incluindo crianças de escola, refugiados, polícias, guardas fronteiriços e um enorme número de pessoas comuns, algumas das quais descobrem aquele par através das redes sociais e reagem enviando presentes e abrindo as portas das suas casas.
Apesar de nunca se ter visto como um activista, Dean aproveita a visibilidade alcançada nas redes sociais, bem como a disponibilidade das pessoas para ajudarem monetariamente as causas aí divulgadas, para consciencializar o seu público para a protecção do ambiente e do bem-estar animal. O êxito das suas iniciativas é tanto que a responsável por uma associação chega a declarar que Dean e Nala são “os melhores embaixadores do bem-estar animal nas regiões do mundo onde os animais são esquecidos”.
Após cerca de um ano e meio, tendo visitado “apenas 18 países, menos de 10% de todas as nações do mundo”, Dean vê-se confrontado com o confinamento na Hungria, em consequência da pandemia de coronavírus que persiste até hoje, o que constitui um sério revés para os seus planos. Contudo, nunca se arrepende da jornada que iniciou e que foi enriquecida pela sua companheira felina. Nas suas palavras, Nala foi a melhor coisa que lhe aconteceu desde há muito tempo, dando-lhe um propósito e transformando-o numa “pessoa mais responsável e também mais atenciosa”.
As aventuras destes improváveis companheiros de viagem são narradas por Dean na primeira pessoa, com descrições tão vívidas dos ambientes e das situações que nos sentimos envolvidos nas suas peripécias, ao ponto de nos preocuparmos realmente com ambos. Como se a narrativa não bastasse, há 16 páginas centrais com fotografias a cores, onde podemos comprovar o elevado grau de fofura da Nala, que nos recorda a máxima de Charles Dickens citada no início do livro: “Não há maior dádiva do que o amor de um gato”.
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